Legislação que proíbe deposição de restos de cigarro na via pública está em vigor desde o início do mês. Grande parte do que ficou vincado continua por ser levado à prática. Escasseiam cinzeiros, falta informação, sobram pontas de tabaco no chão que é de todos. Está aberto o livro de reclamações.
Ficou conhecida como a "Lei das Beatas", entrou em vigor a 3 de setembro, causou burburinho e ainda está longe de ter efeitos práticos. O período transitório de um ano pode ajudar a explicar muita coisa, o certo é que, para as entidades públicas e privadas diretamente afetadas, são mais as dúvidas do que as certezas sobre o que fazer no futuro. E para os fumadores, também, pois a realidade é que continuam a escassear cinzeiros em áreas urbanas.
Uma das medidas previstas na nova legislação contempla que "os estabelecimentos comerciais, designadamente, de restauração e bebidas, os estabelecimentos onde decorram atividades lúdicas e todos os edifícios onde é proibido fumar devem dispor de cinzeiros e de equipamentos próprios para a deposição dos resíduos indiferenciados e seletivos produzidos pelos seus clientes". E é aqui que a polémica começa a nascer. A Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (AHRESP) garante que há muito por esclarecer e quer respostas práticas que coloquem ponto final às dúvidas levantadas.
"Para já, há que explicar aos empresários as novas regras, que ainda não foram explicadas. E depois há que desfazer os equívocos presentes na lei", protesta Ana Jacinto, secretária-geral da AHRESP. "Por exemplo, a legislação diz que estamos obrigados à limpeza de restos de cigarro num espaço de cinco metros. Mas cinco metros exatamente a partir de onde? Vamos limpar espaço público que pagamos para usar, é isso?", indigna-se.
O texto inicial que deu origem à chamada Lei das Beatas foi apresentado em junho pelo PAN e acabou por ser limado depois de ter levantado críticas de vários quadrantes políticos, da Esquerda à Direita. Em causa as multas excessivas inicialmente propostas - que variavam entre o mínimo de 500 e o máximo de 5000 euros. Aquando do primeiro debate parlamentar sobre o projeto-lei, André Silva, único deputado do PAN, levou para o hemiciclo um garrafão de cinco litros repleto de beatas apanhadas por populares num perímetro de apenas 100 metros na Avenida Almirante Reis, em Lisboa. Foi a forma encontrada para tentar sensibilizar os deputados para a urgência do tema.
Porém, a chamada de atenção de André Silva acabou por não surtir efeito, traduzindo-se nos votos contra do CDS-PP e na abstenção de PSD e PCP e de cinco deputados do CDS, nomeadamente Assunção Cristas.
Depois de alterada, a lei foi novamente discutida cerca de um mês mais tarde, a 16 de julho, na Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território, Descentralização, Poder Local e Habitação, colhendo então o apoio de todos os grupos parlamentares à exceção do PCP. Daí até à promulgação pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, foi um passo curto.
As coimas acabaram por ficar entre os 25 e os 250 euros e punem infratores que sejam surpreendidos por PSP, GNR, Polícia Municipal ou ASAE a atirar restos de tabaco em local indevido - "é proibido o descarte em espaço público de pontas de cigarros, charutos ou outros cigarros contendo produtos de tabaco", ficou claramente expresso no artigo terceiro da lei.
Ficaram ainda claras as regras a adotar no que a novos cinzeiros diz respeito, nomeadamente junto a paragens de transportes públicos ou em edifícios estatais e privados.
A Associação Nacional de Municípios (ANMP), que congrega todas as 308 autarquias do país, assimila aos poucos a nova legislação. E sublinha que o pouco (ou nada) que foi feito até ao momento se deve ao facto de as regras não terem sequer um mês de aplicação. "A lei é recente e as câmaras estão a acompanhar e a estudar a sua implementação", limitou-se a afirmar fonte da ANMP.
A posição oficial da ANMP ficou assente num comunicado oficial emitido aquando da publicação da lei em Diário da República. Apesar de "nada ter a opor à presente iniciativa legislativa", a ANMP deixou claro que a mesma "não deve inviabilizar ações, já no terreno, promovidas por alguns municípios." Propôs ainda "a articulação de várias medidas integradas, que passam pela responsabilização do consumidor e de quem detenha ou explore certos tipos de serviços, comércio ou espaços empresariais." Lembrou ainda que durante um ano, serão, também, "impostas obrigações de disponibilização de cinzeiros à porta dos estabelecimentos", além de reconhecer que as medidas visam "reduzir os impactos negativos que o lixo originado pelos filtros dos produtos do tabaco têm no ambiente"