Nada de verdadeiramente surpreendente avulta da formação do novo Governo. De resto, António Costa já avisara ao que vinha. Na definição do rumo que o país levará na próxima legislatura, a bússola apontou sempre no sentido da continuidade. Mas essa opção, sendo o reflexo de uma estratégia de estabilidade que, agora mais do que nunca, o primeiro-ministro quer preservar, também pode ser entendida como um sinal de que o líder do Executivo não quis arriscar para além do necessário. O PS ganhou ascendente no universo eleitoral, mas saiu menos confortável da tentativa gorada de reeditar uma "geringonça" de papel assinado. Este elenco governativo é, também, resultado dessa tensão.
Para um ciclo de poder que promete ser, em muitos momentos, um trabalhoso exercício de negociação (dentro e fora do Parlamento), Costa apresenta uma equipa de combate, ancorada num núcleo duro que, politicamente, acaba por ser um prolongamento da personalidade do primeiro-ministro. Pedro Siza Vieira (promovido a número dois do Executivo), Mário Centeno, Augusto Santos Silva e Mariana Vieira da Silva compõem a guarda pretoriana de que o Governo precisará também para exibir músculo na presidência da União Europeia, no primeiro semestre de 2021. Quanto ao resto, uma ou outra surpresa, mas em áreas que não prometem ser geradoras de mudanças profundas ou de reformas memoráveis. Da Saúde à Justiça, das Finanças à Economia, passando pela Defesa, pelos Negócios Estrangeiros e pela Administração Interna, as caras são as mesmas. E as políticas, imagina-se, também. Em 18 ministros, 14 são repetentes. Sublinhe-se, ainda assim, o ineditismo da recondução do titular da pasta da Educação. Não haverá desculpas para Tiago Brandão Rodrigues não fazer as reformas numa área fundamental como esta. Há, todavia, nesta levemente renovada equipa, uma mudança de monta: as saídas de Ana Paula Vitorino e de Vieira da Silva significam que, doravante, já não haverá familiares diretos à mesa dos Conselhos de Ministros. Uma debilidade crónica do Governo anterior que António Costa vê agora desaparecer.
Os próximos quatro anos (acreditando no cumprimento da legislatura) serão muito exigentes. No plano interno e externo. O caminho das contas certas e da devolução de rendimentos, do crescimento e da credibilidade internacional, foi definidor do país que somos. Mas este Portugal que agora António Costa volta a tomar em mãos continua a ser territorialmente desigual (a propósito, será interessante seguir o trabalho da nova ministra da Coesão Territorial, Ana Abrunhosa), excessivamente dependente da máquina do Estado e tragicamente débil no cumprimento de funções essenciais na Justiça e na Saúde. Sobretudo nesta última, que o primeiro-ministro já assumiu ser uma das grandes prioridades do segundo mandato e que foi o maior gerador de divisões à Esquerda . Resta saber até que ponto Mário continuará a ser Centeno. Isto é, se o apertar do cinto que o ministro das Finanças aplicou religiosamente durante quatro anos conhecerá agora alguma folga, acompanhado de um investimento público que praticamente não existiu.
Este é o Executivo com mais ministros desde 1976. Será um Governo maior um Governo melhor? A avaliação começa agora.