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Médico chinês alertou sobre início do surto. Polícia mandou-o parar

Médico Li Wenliang divulgou uma selfie na cama do hospital. China diz que não há profissionais de saúde infetados. WEIBO

No fim de dezembro, um médico de Wuhan tentou alertar sobre o início do surto de coronavírus, mas a polícia ordenou que parasse. Um mês depois, divulgou a sua história a partir do hospital - também foi infetado.

O novo coronavírus (2019-nCoV) registou os primeiros casos em dezembro de 2019 mas na cidade de Wuhan, epicentro da infeção, as autoridades tentavam abafar a dimensão do surto de pneumonias virais que estava a afetar a população.

Li Wenliang, oftalmologista do Hospital Central de Wuhan, revelou agora as falhas da resposta das autoridades locais nas semanas anteriores à declaração oficial da China do surto do novo coronavírus, no início de janeiro.

Em dezembro, o médico registou sete casos de um vírus semelhante ao SARS (Síndrome Respiratória Aguda Grave, ocorrido em 2002). Os casos pareciam ser provenientes do mercado de peixe de Wuhan e os pacientes ficaram de quarentena no hospital.

No dia 30 de dezembro, Li Wenliang enviou uma mensagem aos colegas de trabalho no hospital, através de um grupo de conversação, a alertar sobre o surto e a aconselhar o uso de roupa de proteção para se evitarem uma eventual infeção.

Quatro dias depois (3 de janeiro), foi convocado a comparecer no Gabinete de Segurança Pública e obrigado a assinar uma carta na qual era acusado de "fazer falsas declarações" que "afetaram gravemente a ordem pública".

"Esperamos que se possa acalmar e refletir sobre o seu comportamento. Advertimo-lo oficialmente: se continuar a insistir, com tanta persistência, e manter essa atividade ilegal, será levado à justiça - entendeu?". E Li Wenliang assinou "Sim, entendo".

O médico de Wuhan foi uma das oito pessoas que a polícia investigou por "espalharem rumores".

No fim de janeiro, Li Wenliang publicou na rede social Weibo (conhecida como o Twitter chinês) uma cópia da carta qu foi obrigado a assinar e revelou o que tinha acontecido. Já com o surto em franca expansão, as autoridades locais pediram-lhe desculpa.

Nas primeiras semanas de janeiro, as autoridades de Wuhan insistiam que apenas aqueles que estiveram em contacto com animais infetados estariam em risco de contrair a infeção. Por isso, não foi dada aos médicos nenhuma indicação de autoproteção no contacto com estes doentes.

Uma semana antes da deslocação à polícia, Li Wenliang tinha prestado assistência a uma mulher com glaucoma e não sabia que ela estava infetada com o novo coronavírus. Dia 10 começou a tossir, no dia seguinte ficou com febre e dois dias depois foi internado no hospital. Os pais também se sentiram mal e foram hospitalizados. Só dez dias depois - a 20 de janeiro - a China declarou emergência para o surto viral.

Li Wenliang diz ter sido submetido a vários testes e que todos os resultados deram negativo para o coronavírus. Até dia 30 de janeiro: "O teste de hoje veio com resultado positivo, o pó assentou, finalmente diagnosticado", escreveu na rede social Weibo.

O "post" recebeu milhares de comentários e palavras de apoio, com alguns seguidores desta rede social a apelidarem o médico de Wuhan como herói, por se ter apercebido do início do surto de coronavírus.