Justiça

Empresas têm de pagar óculos a quem trabalhe com monitores, diz Tribunal Europeu

Decisão aplica-se à necessidade de usar óculos ou lentes de contacto Arquivo

O Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) decidiu que as empresas têm de pagar os óculos ou lentes de contacto aos trabalhadores que deles precisem para trabalhar usando monitores. O acórdão surge após o recurso de um funcionário público romeno que exigia o reembolso dos 530 euros que gastara nuns óculos graduados.

Os juízes europeus fundamentaram-se num artigo de uma diretiva do Conselho Europeu de 29 de maio de 1990 relativa às prescrições mínimas de segurança e de saúde respeitantes ao trabalho com equipamentos dotados de visor. Segundo a decisão do TJUE, publicada a 22 de dezembro, a medida dirige-se aos empregados que necessitem de dispositivos "especificamente destinados a corrigir e a prevenir perturbações visuais relacionadas com um trabalho que envolve equipamentos dotados de visor", por exemplo, um computador. O acórdão frisa que estes "dispositivos de correção especiais" podem ser lentes de contacto ou óculos graduados e que não necessitam de ser usados exclusivamente no âmbito profissional.

Esta diretiva europeia foi transposta para a legislação nacional em 1993, pelo que a decisão do TJUE também será aplicável às relações laborais nacionais. O artigo 7,º do decreto-lei 349/93, relativo à vigilância médica, determina que os trabalhadores de postos de trabalho com ecrã devem ser sujeitos regularmente a exames médicos e, se necessário, exames oftalmológicos.

"Sempre que os resultados dos exames médicos o exigirem e os dispositivos normais de correção não puderem ser utilizados, devem ser facultados aos trabalhadores dispositivos especiais de correção concebidos para o tipo de trabalho desenvolvido", lê-se na alínea 3. Segundo o decreto-lei, as violações deste artigo incorrem numa contraordenação punível com coima de "50 mil a 100 mil escudos" [250 a 500 euros].

O caso chegou ao conhecimento do TJUE após um pedido de esclarecimento do Tribunal de Recurso de Cluj, na Roménia. Um funcionário da Inspeção-Geral da Imigração romena queixara-se de que a sua visão se estava a deteriorar por causa do tempo que passava em frente ao monitor. Após exame, um oftalmologista receitou-lhe um novo par de óculos graduados. O trabalhador gastou 530 euros e pediu o reembolso da despesa. A Inspeção-Geral recusou. Ele processou a instituição.

O tribunal de primeira instância romeno não deu razão ao trabalhador. Considerou que, embora fosse verdade que, segundo a lei romena, a empresa tinha de lhe fornecer os óculos necessários para desempenhar as suas funções, uma vez que o trabalhador optara por comprar os óculos, a empresa não tinha obrigação de o reembolsar. O funcionário recorreu para o Tribunal de Recurso de Cluj que, antes de tomar uma decisão, optou por pedir esclarecimentos ao TJUE.

Os juízes fizeram quatro perguntas sobre a diretiva. A expressão "dispositivos de correção especiais" abrange óculos? Os dispositivos têm de ser usados exclusivamente nas funções laborais? A empresa apenas deve facultar o dispositivo ou também pode reembolsar o trabalhador da despesa? Estes custos são cobertos por um eventual prémio salarial mensal "por condições de trabalho difíceis"?

O TJUE respondeu que os óculos graduados estão abrangidos pela expressão usada no artigo e que não necessitam de ser usados exclusivamente no trabalho. Mais: que as deficiências visuais não têm de ser uma consequência direta do uso dos ecrãs e até podem ser preexistentes ao início das funções. Todavia, ressalva, os óculos devem servir para corrigir e prevenir perturbações visuais relacionadas com o trabalho e não perturbações visuais de ordem geral. Ou seja, têm de ser consequência ou necessários para as funções.

Por fim, os juízes do TJUE explicam que a obrigação pode ser cumprida quer pelo fornecimento dos dispositivos ou pelo reembolso das despesas necessárias efetuadas pelo trabalhador, mas já não pelo pagamento de um prémio salarial geral.

Tiago Rodrigues Alves