Opinião

Paz? Ou parra-pa-pa-pa?

Crimes de guerra, massacres, limpezas étnicas, fome e genocídios viram o Mundo do avesso, mas nada temamos: eis que a Frente Revolucionária de Libertação do Médio Oriente, África, Europa e praticamente o planeta todo – que é como quem diz os Estados Unidos – chegou novamente para nos salvar. De tocha em punho como a estátua-mãe que vê Nova Iorque de cima, a mais poderosa das nações traz promessas de paz e liberdade, garantido que só travando as ameaças externas com músculo poderemos todos cantar o Kumbaya de mãos dadas à volta da fogueira. Uma fogueira que inflama enquanto diz apagar.

Os Estados Unidos surgem há décadas como o salvador de extremismos e extermínios. Fizeram-no na invasão do Afeganistão em 2001, para desmantelar a Al-Qaeda depois do 11 de Setembro, e dois anos mais tarde no Iraque, no que apelidaram de “Operação de Libertação”. Invadiram o país, capturaram Saddam Hussein, fizeram dele prisioneiro de guerra e derrubaram o regime do ditador iraquiano, condenado à morte por enforcamento por um tribunal criado pelo então administrador americano no país, responsável pelo que as organizações não-governamentais consideraram na altura “um julgamento profundamente falho”.

Sob o argumento – que mais tarde se revelaria falso – de que o Iraque estava a fabricar armas de destruição em massa (químicas, biológicas e nucleares), George W. Bush mobilizou cerca de 180 mil soldados norte-americanos para a invasão. Mais de 4400 morreram e quase 32 mil ficaram feridos, segundo números oficiais da Defesa, que excluem as baixas da coligação aliada. No total, ao fim de quase nove anos de guerra que custaram milhares de milhões aos cofres americanos, morreram centenas de milhares de civis iraquianos (300 mil segundo as contas da Universidade de Brown citadas pela Associated Press, mas as estimativas são muito díspares). 

Nessa como noutras incursões que visavam a paz e a queda de um regime mau, os resultados foram países de rastos, fracas alternativas às ditaduras vigentes e terrenos férteis para a emergência de grupos terroristas e conflitos que perpetuaram matanças nas décadas seguintes. A guerra no Iraque começou a 20 de março de 2003, dias depois da Cimeira na Base das Lajes, que irremediavelmente ligou Portugal à decisão de avançar com uma intervenção militar motivada por armamento de destruição maciça cuja existência nunca foi confirmada. Agora, nas vésperas do ataque ao Irão, a Força Aérea norte-americana intensificou a presença no arquipélago açoriano (aguardam-se esclarecimentos do Governo português). 

Embora o Pentágono tenha descartado que a “missão” no Irão vise o derrube do regime, o ataque estratégico e cirúrgico de anteontem à noite contra três alvos nucleares do país – que não provocou vítimas – aumenta a escalada numa região enterrada nos destroços e os temores sobre o que virá a seguir. A prometida paz, já se sabe, tardará.

Rita Salcedas