A "febre do ouro" e outros metais estende-se de norte a sul de Portugal, de Trás-os-Montes ao Algarve. E do interior ao litoral, com uma exploração aprovada para o Parque das Serras do Porto, a cerca de 30 quilómetros da Invicta, apesar da oposição dos municípios.
Denominada "Banjas", a exploração foi autorizada numa área de concessão de cinco quilómetros quadrados (km2), num terreno de Paredes cravado entre os concelhos de Gondomar e Penafiel, que ali se juntam numa fronteira tripartida. A zona, conhecida por antigas minas de ouro romanas, hoje consideradas património histórico e até natural, por albergarem comunidades únicas de morcegos, está também na mira da empresa canadiana “Globex Mining Enterprises Inc.”, com um projeto de pesquisa de cerca de 66 km2, denominado “Valongo”, com uma área de 46 km2, maioritariamente em Penafiel, e outra, de 20 km2, quase toda em Gondomar, segundo dados da Direção Geral de Energia e Geologia (DGEG).
O projeto de prospeção passou ao lado das populações. Segundo o portal Informa, foram registadas 27 participações durante o período de consulta pública às prospeções de “Valongo”. Na auscultação prévia aos municípios, em 2022, as câmaras de Paredes e Gondomar anunciaram “parecer desfavorável” ao projeto. “Por princípio, vamos manter esse parecer negativo”, disse ao JN o atual líder da autarquia gondomarense, Luís Filipe Araújo. "A área integra-se no Parque das Serras do Porto. Estamos a falar de paisagem protegida. Logo por aí, parece que há aqui um conflito com os valores ambientais e patrimoniais que pretendemos preservar", acrescentou o autarca.
A empresa canadiana pretende sondar terrenos nos concelhos de Penafiel, Paredes e Gondomar, abrangendo as freguesias de Rio Mau, Canelas, Capela, Fonte Arcada, Paço de Sousa, Parada de Todeia, Sebolido, Lagares e Figueira, Aguiar de Sousa, Sobreira e União das freguesias de Melres e Medas e Foz do Sousa e Covelo, esta última praticamente toda dentro da área delimitada para as pesquisas. “Não acho razoável", diz Luís Filipe Araújo. “Malgrado estarmos a falar de sondagens, e até admitindo que possam não causar muitos constrangimentos, não sabemos muito bem o que é pretendido. O nosso parecer tem de ser negativo, porque não queremos, obviamente, prejudicar aquelas populações”, acrescentou.
No período de consulta prévia, a Câmara de Valongo entendeu que “não se justifica atribuir novos direitos de prospeção para um território onde o tema da exploração mineira dos depósitos minerais referidos está enquadrado pelo município e é percecionado pela população como integrante do património cultural, nomeadamente arqueológico.” Um entendimento que ganha força com a publicação, em Diário da República, do decreto-lei que conclui o processo de designação da Zona Especial de Conservação (ZEC), que interdita “a instalação de novas explorações de depósitos e massas minerais e a ampliação das existentes por aumento da área licenciada, bem como a prospeção e pesquisa de recursos geológicos”.
Com uma área de cerca de 2,5 km2, localizada nos concelhos de Valongo, Paredes e Gondomar, distrito de Porto, esta ZEC prevê o enquadramento legal para uma “proteção especial, especificamente direcionado à manutenção ou restabelecimento do estado de conservação favorável dos tipos de ‘habitat’ naturais ou seminaturais e das populações das espécies selvagens com presença significativa nessa zona” e enquadra-se na transposição da Diretiva Habitats, a qual o Estado Português está em incumprimento há mais de 10 anos, tendo sido avisado anteontem pela União Europeia para a possibilidade de ter de responder pelo incumprimento perante o Tribunal Europeu de Justiça.
A proteção da ZEC Valongo não abrange o concelho de Penafiel, onde estão cerca de 36 dos 46 km2 de área de prospeção pedida pela Globex Mining. Em 2022, a Câmara admitiu emitir, na consulta prévia dar um parecer positivo favorável, “desde que salvaguardadas todas as recomendações de boas práticas para os trabalhos de prospeção e pesquisa”. Contactada pelo JN, fonte da autarquia disse que "está atenta e a acompanhar de perto" o processo.
A Câmara Municipal "tem plena consciência de possíveis preocupações da comunidade e reforça que continuará a agir com responsabilidade, acompanhando o processo em todas as fases e salvaguardando, sempre, os interesses do concelho, a proteção do património e a qualidade de vida da população", disse fonte da autarquia penafidelense. "Nesta fase está apenas em causa uma atividade de prospeção e pesquisa, promovida por uma empresa privada e autorizada pela Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG)", referiu.
Considerando que se trata "de trabalhos exploratórios de natureza preliminar e com impacto reduzido", a autarquia penafidelense admite que os resultados desta fase podem, inclusive, vir a demonstrar que não é viável avançar para qualquer tipo de exploração. Uma perspetiva diferente da do concelho de Gondomar, com quem partilha fronteira junto ao rio Douro. “Mesmo tratando-se apenas de sondagens, não vão gastar dinheiro sem ter uma ideia minimamente firmada de avançar com qualquer coisa. Se calhar têm já uma ideia do que podem encontrar”, diz Luís Filipe Araújo.
O projeto das “Banjas”, estende-se por um vale do concelho de Paredes em forma de seta entre Gondomar e Penafiel, em volta de dois pequenos cursos de água, o rio Mau, e um afluente deste, que desagua no Douro, a poucos quilómetros, a montante das captações das Águas de Portugal, em território gondomarense. A prospeção pedida, “Valongo”, abrange o rio Sousa, outro afluente do Douro. “Todas as cautelas são poucas, quando há proximidade de linhas de água. Temos de estar preocupados e atentos”, diz Luís Filipe Araújo, dando o exemplo um antigo complexo mineiro no concelho. “É um símbolo de São Pedro da Cova e de Gondomar. Estamos a falar de património histórico e uma parte importante da nossa identidade, mas também sabemos as consequências negativas que uma atividade destas tem para as populações. E quando há contacto com linhas de água, não se pode estar a dizer que não há problema”, argumenta.