Cultura

Polémica com Eça: “Os políticos querem levar o pouco que já temos”

Manifestação: habitantes da freguesia de Santa Cruz do Douro, em Baião, não querem perder Eça de Queiroz para Lisboa. António Orlando/JN

Manifestação em Baião junta três dezenas de pessoas contra a trasladação do corpo do escritor Eça de Queiroz para o Panteão Nacional em Lisboa. "Isto é tudo uma palhaçada", disse ex-presidente da Junta de Santa Cruz do Douro.

“Esta passeata que se pretende para Lisboa não passa de um desfile de vaidades. Com todo o respeito, é uma palhaçada”, assim foi dito a  meio da tarde deste domingo, em Tormes, Baião, por António Fonseca, ex-presidente da Junta de Freguesia de Santa Cruz do Douro. O antigo autarca é o rosto de uma manifestação popular realizada em defesa da permanência dos restos mortais de Eça de Queiroz (1845-1900) no cemitério daquela freguesia. 

Cerca de três dezenas de pessoas, debaixo de um sol escaldante, disseram presente naquela que terá sido a mais pacífica das manifestações alguma vez realizadas. Mas o tom era de alguma indignação, como se vê na pergunta de Adérito da Silva, habitante local: “Quando é que deixam o Eça em paz?!”.

“A manifestação teve como propósito manter acesa a luta” porque o Supremo Tribunal Administrativo (STA), só hoje, ou o mais tardar na terça feira, é que deverá dizer se permite a trasladação de Eça ou se acede às pretensões dos familiares do escritor que se opõem à viagem do autor de “A cidade e as serras” para o Panteão Nacional, em Lisboa. 

À sombra, num dos miradouros de descanso da EN 108, junto ao caminho de acesso à Fundação Eça de Queiroz (FEQ), os “manifestantes”,  mostraram o seu repúdio à iminente perda de uma das referências do turismo cultural local.  Os habitantes juram a pés juntos que são inúmeros os turistas que, uma vez na FEQ, se deslocam ao cemitério para homenagear o escritor sepultado em jazigo familiar onde se encontram também os restos mortais do filho, do neto e de Maria da Graça Salema de Castro, a mulher que em 1989, com ajuda do autarca de então, António Borges (PS), conseguiu a trasladação de Eça para Tormes. 

Trazer em vez de levar

“Os políticos em vez de trazerem algo de Lisboa para cá que ajude a desenvolver o interior, ainda nos querem levar o pouco que já temos”, disse ao JN o ex-autarca de Santa Cruz do Douro, negando que com este movimento estivesse a tentar tirar dividendos políticos que lhe permitam reaver a Junta de Freguesia que perdeu nas últimas autárquicas.

Depois, mas antes de ler ao microfone uma declaração do decano herdeiro António Eça de Queiroz,  António Fonseca fez-se ouvir ao responsabilizar José Luís Carneiro pela proposta do PS de trasladação de Eça, quando o ex-presidente da Câmara e atual MAI era deputado do PS: “Foi uma autêntica traição tudo fazer sem dar a conhecer primeiro o processo aos bisnetos de Eça e à junta de freguesia [à data presidida por ele, António Fonseca] que teria uma palavra a dizer”, acusou. 

Refira-se que José Luís Carneiro, quando contactado pelo JN, à data da apresentação do processo na Assembleia da República, remeteu explicações para o presidente da FEQ, dizendo que a iniciativa tinha partido dessa mesma instituição. 

António Orlando