Nova edição de "Verão índio" faz regressar às livrarias uma parceria entre nomes históricos.
Distinguido como Melhor Álbum Estrangeiro no Festival de BD de Angoulême, em 1987, "Verão índio" é uma das reedições de topo do ano transato. A nova edição da Ala dos Livros volta a colocar nas livrarias nacionais uma colaboração marcante entre dois génios da banda desenhada: Hugo Pratt e Milo Manara, que souberam expressar nela o melhor de cada um.
Pratt não esqueceu as questões comportamentais, religiosas e filosóficas inerentes aos seres humanos nem a forma como as diferenças culturais por vezes os separam e escreveu uma história dura e violenta que decorre no vasto território dos Estados Unidos durante a colonização pelos primeiros peregrinos oriundos do Velho Mundo, com regras estritas e pretensões puritanas.
Podendo ser considerado um western atípico, pelo confronto entre índios e brancos, espoletado antes de mais por um mal-entendido, "Verão índio" é muito mais do que isso; é uma história de aparências e perversões, que coloca em causa a falsa religiosidade, a estabilidade do equilíbrio familiar em meios pequenos e isolados, a recusa da diferença e a incapacidade de ouvir.
Na sua génese está a violação de uma jovem branca perpetrada por dois índios, mortos de imediato, que vai desencadear uma onda de incompreensão e tornar efetivos conflitos latentes.
Para a desenhar, a escolha não poderia ter sido mais acertada. Mestre do erotismo, muitas vezes a raiar a pornografia, o também italiano Milo Manara teve momentos escritos à medida da sua arte e da sua capacidade de desenhar belas e sensuais mulheres, em cenas em que a provocação e a transgressão são incontornáveis, embora revele uma assinalável contenção.
Ao mesmo tempo, demonstra também um enorme à-vontade no desenho dos cenários selvagens que servem de fundo a "Verão índio" e nos confrontos em que se multiplicam as personagens e as respetivas interações. E brilha nas cenas mudas, como a primeira dezena de pranchas do livro, mostrando como uma sucessão de imagens pode ser mais eloquente e vibrante do que muitas páginas preenchidas com letras. v