A riqueza combinada dos multimilionários aumentou 1,94 biliões de euros em 2024. São cerca de 55,4 mil milhões de euros por dia. O relatório da Oxfam Intermón critica, ainda, o empossamento de Donald Trump, um "presidente bilionário apoiado e comprado pelo homem mais rico do Mundo".
Tal significa que a riqueza cresceu a um ritmo três vezes superior ao do ano anterior, de acordo com a organização não-governamental (ONG) de cooperação internacional e comércio justo espanhola.
Foi esta a principal conclusão do relatório intitulado “A pilhagem continua”, que a ONG hoje divulgou, por ocasião do início do Fórum Económico Mundial de Davos, que todos os anos reúne os principais líderes políticos e económicos do Mundo naquela cidade alpina.
Só no último ano, refere o relatório, surgiram em média quase quatro novos multimilionários por semana, dado que a Oxfam põe em contraste com os dados da pobreza do Banco Mundial, que estima que o número de pessoas que vivem com menos de 6,85 dólares por dia (6,66 euros por dia) quase não se alterou desde 1990.
Em 2024, havia em todo o Mundo 2769 multimilionários, em vez de 2565 no ano anterior, e a sua riqueza combinada aumentou de 13 para 15 biliões de dólares (12,6 para 14,5 biliões de euros) em apenas 12 meses. É o segundo maior aumento da riqueza combinada dos multimilionários num único ano desde que há registos.
A riqueza conjunta dos dez homens mais ricos do Mundo aumentou, em média, quase 100 milhões de dólares (97,2 milhões de euros) por dia, indica o estudo, que refere que mesmo que perdessem 99% da sua riqueza de um dia para o outro, “continuariam a ser multimilionários”.
A ONG prevê que, em menos de uma década, surja o primeiro “bilionário” do planeta e não exclui a possibilidade de haver pelo menos cinco.
Um "colonialismo moderno" do Sul para o Norte
A nível mundial, o relatório revela que 36% da riqueza dos mais ricos é herdada e 61% é também marcada pelo clientelismo e/ou ligada ao poder monopolista. A Oxfam baseia-se nos dados do ranking de riqueza da revista Forbes, que mostram que todos os multimilionários com menos de 30 anos herdaram a sua riqueza e, segundo dados do banco suíço UBS, nos próximos 20 a 30 anos, mil dos multimilionários atuais deixarão aos seus herdeiros mais de 5,2 biliões de dólares.
Para a Oxfam, o sistema “faz com que se movam grandes fluxos de dinheiro do Sul global para o Norte, beneficiando a população mais rica”, numa espécie de “colonialismo moderno”.
Só em 2023, através do sistema financeiro, terão sido retirados 30 milhões de dólares (29,1 milhões de euros) por hora dos países do Sul global para o 1% mais rico dos países do Norte global, como o Reino Unido, os Estados Unidos e França.
Deste modo, os “super-ricos” dos países do Norte global controlam 69% da riqueza mundial, concentram 77% da riqueza conjunta de todos os multimilionários e representam cerca de 68% do total, embora constituam apenas 21% da população mundial.
Para contextualizar esta desigualdade, a Oxfam refere o problema da habitação em Espanha e estima que “os cinco futuros bilionários do planeta terão tanto dinheiro que poderão comprar todas as casas do país”.
Oxfam exige taxas
A Oxfam propõe uma série de medidas para mitigar a crescente desigualdade entre os mais ricos e o resto do planeta, sugerindo, entre outras, que os Governos se comprometam a garantir que o rendimento dos 10% mais ricos da população não excederá o dos 40% mais pobres, tanto a nível nacional como mundial.
O relatório insta também a um aumento dos impostos sobre as grandes fortunas, através de um novo sistema fiscal internacional concebido pelas Nações Unidas, e à eliminação dos paraísos fiscais — já que, segundo a Oxfam, metade dos multimilionários do Mundo vive em países sem imposto sobre as heranças para os descendentes diretos.
“As heranças têm de ser tributadas para desmantelar a nova aristocracia”, exige o estudo divulgado, acrescentando que é preciso “reduzir radicalmente a desigualdade”. Só assim, acrescenta a Oxfam citando o Banco Mundial, se “poderá acabar com a pobreza três vezes mais rapidamente”. Por outro lado, afirma, “os governos também têm de acabar com o racismo, o sexismo e as divisões que sustentam a exploração económica contínua”.
No relatório, exige-se também o fim do fluxo de riqueza do Sul para o Norte, seja através do cancelamento de dívidas, seja eliminando o domínio dos países ricos e das empresas sobre os mercados financeiros e as regras comerciais. “Isto significa acabar com os monopólios, democratizar as regras das patentes e regular as empresas para garantir que pagam salários dignos e limitar a remuneração dos CEO”, refere.
Significa também “reestruturar os poderes de voto no Banco Mundial, no FMI e no Conselho de Segurança da ONU para garantir uma representação justa dos países do Sul Global”, defende, referindo que “as antigas potências coloniais devem enfrentar os danos duradouros causados pelo seu domínio colonial, apresentar desculpas formais e fornecer reparações às comunidades afetadas”.
Empossar um bilionário
O relatório, publicado também no dia em que o bilionário Donald Trump, apoiado pelo homem mais rico do Mundo, Elon Musk, é empossado como presidente dos Estados Unidos, refere ainda que “a captura da economia global por alguns privilegiados atingiu níveis anteriormente considerados inimagináveis”.
“O fracasso em travar os multimilionários está agora a gerar futuros trilionários. Não só a taxa de acumulação de riqueza bilionária acelerou — triplicou — como também o seu poder”, afirma o diretor executivo da Oxfam Internacional, Amitabh Behar, no estudo.
“A joia da coroa desta oligarquia é um presidente bilionário, apoiado e comprado pelo homem mais rico do Mundo, Elon Musk, que dirige a maior economia do Mundo. Apresentamos este relatório como um forte aviso de que as pessoas comuns em todo o Mundo estão a ser esmagadas pela enorme riqueza de alguns”, sublinha Behar.
“A riqueza imerecida e o colonialismo — entendidos não só como uma história de extração brutal de riqueza, mas também como uma força poderosa por detrás dos atuais níveis extremos de desigualdade — são dois dos principais impulsionadores da acumulação de riqueza bilionária”, aponta a confederação.
Os países de baixo e médio rendimento gastam, em média, quase metade dos seus orçamentos nacionais em pagamentos da dívida, lamenta o diretor executivo da Oxfam.
“Entretanto, o dinheiro desesperadamente necessário em todos os países para investir nos professores, comprar medicamentos e criar bons empregos está a ser desviado para as contas bancárias dos super-ricos. Isto não é apenas mau para a economia — é mau para a humanidade”, conclui.