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Cabeças de porco e ratos decapitados intimidam jornalistas na Indonésia

O primeiro caso aconteceu na semana passada e desde aí mais jornalistas têm vindo a ser ameaçados Foto: Rodrigo Cabrita/Arquivo

Na Indonésia, vários jornalistas têm sido ameaçados com cabeças de porco e ratos decapitados. Os responsáveis pelo envio dos restos mortais dos animais têm como objetivo restringir a liberdade de imprensa da terceira maior democracia do mundo.

O pânico instalou-se nas redações dos órgãos de comunicação social da Indonésia desde que a jornalista Francisca Christy Rosana recebeu uma encomenda na redação da revista “Tempo”, que integra um grupo de média do país, que continha uma cabeça de porco com as orelhas cortadas.

O primeiro caso aconteceu na semana passada e desde aí mais jornalistas têm vindo a ser ameaçados, no que tem sido uma crescente intimidação dos jornalistas indonésios. “Fiquei chocada, chorei e fui imediatamente retirada por alguns dos meus amigos”, relatou a jornalista, que teme pela família.

Dias depois, seis ratos decapitados, embrulhados em papel, foram deixados nos escritórios do “Tempo”, mas a situação não acabou por aí. “Bombas, doxing [divulgação de dados privados], desvio de números de telefone. Já tivemos muitas ameaças no passado”, revelou Bagia Hidayat, chefe de redação da “Tempo”. No passado, a revista semanal já tinha recebido várias ameaças e a sua publicação chegou, inclusivamente, a ser proibida devido aos seus conteúdos considerados polémicos. No entanto, “agora é muito físico", confessa a jornalista. "Pela primeira vez, foram usados órgãos de animais como mensageiros. É muito assustador.” 

Bagia acredita que todas as ameaças têm um objetivo e um significado: a carne de porco, por exemplo, é proibida pela religião islâmica; os seis ratos corresponderão aos seis apresentadores do podcast com mais audiência da revista, "Bocor Alus Politik", que debate temas sociais fraturantes.

No podcast, Francisca Rosana é uma das anfitriãs e única mulher da equipa. A jornalista acredita que os assuntos polémicos a que tem feito referência, de caráter político e judicial, podem estar na origem das ameaças. “Este terror está relacionado com a minha escrita. Muitas vezes faço reportagens que criticam o governo”, assumiu Francisca.

A jornalista também foi vítima de "doxing" (isto é, da recolha e divulgação pública de dados pessoais) e a família foi alvo de ameaças através de persistentes contactos telefónicos. “Quero dizer a todas as mulheres jornalistas: não tenham medo da intimidação, porque aqueles que intimidam são os que têm medo de verdade”, partilhou Francisca, em comunicado à imprensa.

A Aliança de Jornalistas Independentes da Indonésia condenou o ataque, descrevendo-o como uma “presença de morte simbólica”, que prejudicou a publicação de notícias de qualidade.

Inicialmente, em resposta ao sucedido, o porta-voz da Presidência do país, Hasan Nasbu, sugeriu que a jornalista “cozinhasse a cabeça” que recebeu na redação da “Tempo”. Só mais tarde, depois da grande repercussão do comentário, é que Hasan esclareceu a observação, garantindo que a Indonésia continua empenhada em tentar defender a liberdade de imprensa.

As autoridades estão à procura dos responsáveis pelo envio dos restos animais.

Redação