Praça da Liberdade

No país do desperdício

De acordo com dados divulgados na passada semana pelo Instituto Nacional de Estatística, dois em cada cinco jovens portugueses consideram ter mais competências (22,7%) ou mais qualificações (20,8%) do que as requeridas para o desempenho das respetivas profissões. São números que configuram o retrato trágico de um país atrasado, condenado aos baixos salários e à incapacidade para produzir valor acrescentado, que desperdiça as habilitações dos seus cidadãos e não lhes oferece perspetivas de futuro; nem sequer lhes permite tirar partido das competências que desenvolveram.

O comum, num país normal, é que os cidadãos necessitem de formação ao longo da vida, de forma a dar resposta às solicitações e às exigências de um mercado de trabalho dinâmico. Portugal parece, todavia, alheio à lógica mais elementar: sustenta, por um lado, um modelo económico assente em emprego desqualificado e, por outro, forma jovens para empregos que não existem e para empresas que os não desejam. Mal comparando, é como habilitar rabequistas e condená-los a serem sapateiros.

É evidente, porém, que o país necessita de romper com o ciclo de desperdício, atraso e pobreza, e de encontrar um desígnio ambicioso para o futuro e um caminho para o progresso a que devemos aspirar. Terá, para isso, de continuar a qualificar os mais jovens e a reforçar as competências daqueles que já estão no mercado de trabalho, estimulados a regressar à universidade ou ao politécnico por empresas e empresários capazes de modificar o foco e de apostar no talento e em produtos e serviços de valor acrescentado.

O atual quadro de financiamento comunitário dispõe, aliás, de instrumentos que permitiriam apoiar a transformação de uma realidade disfuncional e distópica em algo que se assemelhe a um país decente e digno, nem sequer do domínio da utopia. A fim, porém, de tirar partido desta oportunidade única de modernização e desenvolvimento, conviria que os fundos europeus não fossem malbaratados a construir rotundas e fontanários, e a comprar máquinas de fotocópias. Teríamos, portanto, de mudar de vida.

António Sousa Pereira