Cultura

Spielberg revela segredos de “Tubarão” no documentário dos 50 anos do filme

Steven Spielberg (atrás da câmara) realizou um dos filmes mais importantes da sua carreira com apenas 29 anos, em 1975. Foto: Direitos Reservados

O primeiro blockbuster do cinema foi realizado em 1975. Steven Spielberg duvidou que o conseguisse concluir, ganhou stress pós-traumático e chorou muitas vezes no barco. "Tubarão" é hoje um marco da cultural pop.

Steven Spielberg vai revelar segredos e histórias inéditas sobre a produção do primeiro grande blockbuster do cinema, “Tubarão”, num documentário de Laurent Bouzereau que assinala o 50.º aniversário do filme.

Em “50 anos de Tubarão: a história definitiva dos bastidores”, que se estreia no serviço de streaming Disney+ este domingo, e no canal National Geographic no dia 14 de julho, Spielberg mostra imagens de arquivo que nunca tinham sido vistas e conta como achou que “Tubarão” ia acabar com a sua carreira. 

O realizador confessa que sofreu de stress pós-traumático durante anos após a conclusão do filme e que chegava a deitar-se no barco da produção, “Orca”, para chorar. 

“O que me surpreendeu mais foi o nível de intimidade que Steven tem com esta história e a partilha de como ficou traumatizado pelos desafios que enfrentou ao fazer o filme”, disse em entrevista à agência Lusa o realizador Laurent Bouzereau.

“A perspetiva humana é sempre comovente, relacionável e catártica. O que ofereço no meu filme é uma história de perseverança e ultrapassar as expectativas”, diz. 

Bouzereau reconheceu que, em meio século, muito foi dito e contado sobre “Tubarão” (ou “Jaws”, no título original em inglês), mas o nível de detalhe e as imagens inéditas tornam o documentário diferente: além dos testemunhos de alguns dos maiores cineastas e estrelas de Hollywood, incluindo George Lucas, James Cameron, J. J. Abrams, Guillermo del Toro, Jordan Peele e Emily Blunt. 

“Todos foram influenciados por ‘Tubarão’ de formas diferentes”, explica o realizador. Ele próprio emigrou de França para os Estados Unidos para cumprir o sonho de fazer cinema no sítio onde se passa o filme, a que assistiu quando era adolescente. 

O luso-americano Joe Manuel Alves

 O documentário explora também a influência tremenda que esta história teve na forma como as pessoas olham para os tubarões. Baseado no livro de Peter Benchley com o mesmo título, publicado em fevereiro de 1974, o filme gerou um interesse que antes não existia em torno do grande predador do oceano. 

“É uma boa história, a velha história de como as pessoas reagem a ameaças que não conseguem controlar”, disse à Lusa Wendy Benchley, viúva do autor. “As pessoas nunca se tinham concentrado em tubarões antes disto. Quando o Peter publicou o livro, tocou em algo não só de medo mas também de fascínio, e impulsionou a ciência dos tubarões”. 

O documentário inclui imagens e histórias do luso-americano Joe Manuel Alves, que desenhou o tubarão mecânico original e enfrentou dificuldades dramáticas para o fazer funcionar. Filho de emigrantes portugueses, Alves publicou o livro “Designing Jaws” ("Desenhando ‘Tubarão’") sobre o trabalho que fez e, numa entrevista anterior à Lusa, disse que continua a receber correio de fãs todas as semanas. 

Os problemas com o tubarão "animatrónico" gigante do filme não foram únicos na produção. “Tubarão” excedeu em muito o prazo de filmagens e o orçamento que lhe estava destinado, chegando a duvidar-se que seria completado. A equipa, os atores e Steven Spielberg estiveram isolados na famosa ilha Martha’s Vineyard, ao largo da costa de Massachusetts, nos EUA, durante mais de cinco meses. O calendário original era de um mês e 25 dias de rodagem. 

“Ele sentia muita culpa por estar muito atrasado e as pessoas ressentiam-se por não poderem ir para casa”, salientou Laurent Bouzereau. No documentário, Spielberg diz que o cerne do filme é voltar para casa, algo que Bouzereau identificou como um tema recorrente nos filmes do cineasta de 78 anos. 

Um marco no cinema e na cultura pop

Mesmo com o sucesso astronómico que teve após a estreia, a 20 de junho de 1975, Spielberg continuou atormentado. E às filas intermináveis nos cinemas, e à loucura do merchandising, juntou-se um efeito inesperado: aventureiros começaram a matar tubarões no mar como troféus, querendo imitar um dos heróis do filme.

“Embora Steven tenha feito um filme de monstros, era uma metáfora”, disse Bouzereau. “Mas as pessoas tomaram-no de forma literal e houve um massacre de tubarões, algo que eu desconhecia”. 

O realizador quis incluir esse transtorno no documentário e chamar a atenção para o trabalho de conservação que tem que ser feito, algo que é a especialidade de Wendy Benchley, uma conservacionista marítima que trabalha com a Wild Aid. 

“Toda a gente retira coisas diferentes do filme e do livro, mas sabemos que criou fascínio com os tubarões e mais investigação”, disse. “É incrivelmente devastador pensar que 100 milhões de tubarões são mortos todos os anos para fazer sopa de barbatana e consumo da carne”. 

Wendy Benchley espera agora que o documentário “50 anos de Tubarão: a história definitiva dos bastidores” renove o interesse pela proteção dos tubarões “e de como é importante salvá-los para manter o ecossistema e o equilíbrio dos oceanos”.

A viúva do autor também salientou que esta é uma história poderosa, passada de geração em geração, que mudou a história do cinema. 

O documentarista Bouzerau tem a mesma opinião. “O filme não tem uma única ruga” disse, vincando que “foi um enorme marco no cinema, na cultura pop e até na política”, e que, 50 anos depois, continua a ser relevante.

JN/Agências