Opinião

Telemóvel na mão, peso na coluna

O telemóvel tornou-se indispensável na vida quotidiana. Em média, passamos mais de três horas por dia em frente ao ecrã - muitas vezes em posturas incorretas e com movimentos repetitivos que não foram pensados para a fisiologia do corpo humano. O impacto não é apenas psicológico: há repercussões musculoesqueléticas cada vez mais frequentes, tanto em jovens como em adultos ativos.

O "text neck"

A flexão prolongada da cabeça para baixo aumenta a pressão sobre a coluna cervical em até 25 kg, o equivalente a carregar uma criança pequena sobre o pescoço durante horas. Esta sobrecarga pode provocar:

Cervicalgias (dores no pescoço) e rigidez muscular;

Alterações posturais e desequilíbrios da coluna;

Em casos mais graves, hérnias discais cervicais.

O fenómeno conhecido como "text neck" deixou de ser uma curiosidade para se tornar um motivo crescente de consulta médica, inclusive em adolescentes.

Mãos e punhos

O uso excessivo do telemóvel não afeta apenas a coluna. O movimento repetitivo dos polegares e a sobrecarga dos punhos estão associados a:

Tendinites do polegar ("WhatsAppitis"), cada vez mais diagnosticadas;

Síndrome do túnel cárpico, caracterizado por formigueiro e perda de força na mão;

Inflamação articular crónica, que pode comprometer tarefas simples do dia a dia.

Estas patologias, quando desvalorizadas, podem evoluir para dor persistente, limitação funcional e até necessidade de cirurgia.

O fator invisível

Para além da dor, há um impacto mais subtil, mas igualmente relevante: a fadiga muscular precoce. Atletas, profissionais de escritório e estudantes relatam menor tolerância ao esforço, instabilidade postural e dificuldades em treinar ou desempenhar atividades prolongadas.

Isto significa que o telemóvel, usado de forma inadequada, não é apenas um risco para a saúde geral, pode comprometer o desempenho desportivo e profissional.

Como prevenir?

Embora não possamos eliminar o telemóvel da rotina, podemos reduzir drasticamente o impacto com medidas preventivas:

Elevar o ecrã à altura dos olhos, evitando a flexão cervical prolongada.

Fazer pausas regulares (30/40 minutos), com mobilização do pescoço, ombros e mãos.

Alongar os flexores do punho e do polegar para contrariar a sobrecarga repetitiva.

Reforçar a musculatura cervical e do core, melhorando a estabilidade postural.

Consultar precocemente em caso de dor persistente, formigueiros ou perda de força.

"Likes" para a saúde

O corpo humano não foi concebido para horas de flexão cervical nem para milhares de movimentos repetitivos com o polegar. As consequências já se fazem sentir: dores cervicais precoces, tendinites no polegar, inflamações articulares e limitações funcionais que comprometem não só a saúde, mas também a qualidade de vida.

A boa notícia é que a prevenção está ao alcance de todos. Pequenos ajustes de postura, pausas regulares, exercícios de mobilidade e avaliação médica precoce podem fazer a diferença entre manter a performance ou sofrer com dor crónica.

Em última análise, a escolha é simples: deixar que o telemóvel pese cada vez mais no corpo ou adotar estratégias que devolvem leveza à coluna e às mãos. A prevenção é o verdadeiro "like" que garante saúde e mobilidade no futuro.

António Nogueira de Sousa