Cultura

Cineasta aveirense Manuel Paula Dias morre aos 90 anos

Manuel Paula Dias dividiu a vida entre a indústria de fundição e o cinema, que assumiu como paixão profunda e constante. Foto: Direitos reservados

"Pertenceu ao "Grupo de Aveiro", núcleo que marcou o cinema não-profissional português dos anos 1960 e 70. Documentário "Sal, duro sal" é uma das obras mais reconhecidas de Manuel Paula Dias.

"Faleceu o cineasta aveirense Manuel Paula Dias, que iria completar 91 anos no próximo dia de Natal. Figura ímpar da memória cultural de Aveiro, dividiu a sua longa vida entre a indústria de fundição - onde trabalhou desde muito cedo - e o cinema, que assumiu como paixão profunda e constante", revelou o Cineclube de Avanca em comunicado.

Manuel Paula Dias filmou, sobretudo, nas décadas de 1960 e 1970, recorrendo aos formatos característicos do cinema amador da época e, através da sua câmara, "documentou como poucos a vida da cidade, da região e da ria de Aveiro, criando um vasto e valioso arquivo audiovisual que preserva tradições, paisagens e modos de vida hoje desaparecidos".

Na nota de imprensa, o Cineclube de Avanca, com sede em Estarreja, distrito de Aveiro, destaca que Manuel Paula Dias "deixa um legado maior no cinema documental português e uma memória artística profundamente entrelaçada com a história de Aveiro e da sua gente".

Documentarista intenso e autêntico

A sua obra mais conhecida é o documentário "Sal, duro sal", que capta com intensidade e autenticidade a dureza do trabalho nas marinhas de sal aveirenses. Este filme, juntamente com outros da sua autoria, integrou a retrospetiva que o 3.º Mar Film Festival lhe dedicou em 2019, no Museu Marítimo de Ílhavo.

Nesse mesmo ano, o RIOS - Festival Internacional de Cinema Documental e Transmedia, realizado em Vila Real por Anabela Branco de Oliveira, acolheu uma retrospetiva dedicada ao cinema de Aveiro, exibindo "Sal, duro sal" e "Um olhar diferente pela Ria de Aveiro", contribuindo para dar nova visibilidade à obra do cineasta.

Em 2009, Manuel Paula Dias realizou um remake de "Decomposição", um filme originalmente rodado em 1972, uma ficção experimental que, no seu início, "relembra as dificuldades que o cinema amador e independente enfrentava com a ação da censura".

Em colaboração com Ernesto Barros, realizou ainda "Derrame", filme rodado em 1975 e concluído em 1977, que inclui imagens únicas do funeral do soldado morto no assalto à sede de Aveiro do Partido Comunista Português, num momento particularmente tenso do pós-25 de Abril.

Um dos maiores do "Grupo de Aveiro"

O Cineclube de Avanca realça ainda que Manuel Paula Dias e Ernesto Barros integraram o chamado "Grupo de Aveiro", núcleo que marcou o cinema não-profissional português dos anos 60 e 70, ao lado de nomes como Vasco Branco e Manuel Matos Barbosa.

"Este grupo deixou um importante legado fílmico profundamente ligado à identidade cultural de Aveiro e da sua região", considera o Cineclube.

O Festival de Avanca, dedicado ao cinema, televisão, vídeo e multimédia, homenageou Manuel Paula Dias em 2014. O cineasta foi por diversas vezes jurado no certame, assim como no Festival Internacional de Cinema de Sever do Vouga, continuando a ser reconhecido pela sua experiência e contributo.

"Nos últimos anos, dedicava-se à escrita de um livro sobre a história da sua família e o início da indústria de fundição em Aveiro, um relato marcado pelo episódio dramático de um avião que, saído da Base Aérea de São Jacinto, se despenhou nos terrenos pertencentes ao seu pai", revelou ainda o Cineclube de Avanca.

JN/Agências