Chama-se Cinema Comunitário Krahô e foi inaugurado há dias. Localizado na aldeia Koprer, é a primeira sala de cinema em terras indígenas do Brasil, e terá uma programação regular organizada pela comunidade. A partir de 2026, a aldeia vai receber encontros regulares de cinema, realizados em parceria com festivais e instituições culturais de todo o país.
Está também em construção um acervo audiovisual, reunindo quase um século de registos sobre os Krahô e outros povos indígenas do Brasil. Esse material ficará disponível numa rede interna da aldeia, podendo ser projetado a qualquer momento no ecrã do cinema.
O cinema foi construído pela própria comunidade, contando também com a participação de trabalhadores do município de Itacajá. E foi feito em parceria com os cineastas Renée Nader Messora, João Salaviza, Julia Alves e Ricardo Alves Jr. O projeto arquitetónico foi desenvolvido em diálogo com o arquiteto Thiago Benucci, e contou também com Simone Giovine, que acompanhou a construção do espaço.
O projeto arquitetónico procura reinventar o que pode ser uma sala de cinema num contexto de aldeia. Propõe uma arquibancada escavada no próprio solo, coberta por um grande telhado, mantendo as laterais permeáveis à ventilação natural e também à circulação das pessoas e à visão dos arredores. Assim, procura inserir-se de maneira harmoniosa com a paisagem e a comunidade.
O Cinema Comunitário Krahô está equipado com um projetor digital de alta-definição. A sala tem capacidade máxima para 150 pessoas, que podem assistir aos filmes sentadas nos bancos corridos de madeira ou deitadas em redes penduradas ao redor - de onde é possível ver a tela, o pátio da aldeia e o céu estrelado do Cerrado.
O sonho começou a ganhar forma há mais de uma década, quando a jovem Ilda Patpro Krahô participou das primeiras oficinas de audiovisual do coletivo Mentuwajê Guardiões da Cultura. Mais recentemente, Patpro foi argumentista e atriz do filme "A Flor do Buriti", segunda obra realizada com o povo Krahô pelo português João Salaviza e pela brasileira Renée Nader Messora, depois de "Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos". Ambos os filmes levaram os Krahô ao Festival de Cannes e a outros festivais pelo mundo fora.
"Hoje temos televisão, telemóvel e internet nas aldeias. Mas as histórias que vemos ainda são as histórias do branco", referiu na ocasião Ilda Patpro Krahô. "Quando estive nos festivais de cinema, senti a alegria de ver as nossas imagens nas telas. O cinema é diferente - é um lugar de encontro, onde tem espaço para as nossas memórias e o nosso olhar. Quero que as crianças Krahô possam lembrar-se sempre dos mais velhos e que, sentadas no nosso Cinema Comunitário, possam imaginar o futuro a partir da aldeia e das nossas imagens. E queremos receber os nossos parentes de outros povos, com os seus filmes e as suas histórias. Tem lugar para todo mundo no nosso Cinema." E Patpo concluiu assim o seu discurso na inauguração do cinema: "Eu tenho 29 anos, mas eu não tenho medo de nada! Eu vou lutar pelo meu povo!"
Quanto a Messora e Salaviza, referiram: "O Cinema Comunitário Krahô, aqui na aldeia Koprer, é mais um instrumento de luta pela autodeterminação, pela preservação da memória coletiva e pela afirmação cultural do povo Krahô."