Em 25 de Abril de 2026, Portugal celebrará 50 anos da Constituição da República. Mais do que cerimónias e discursos, precisamos de responder a uma pergunta simples: porque não descentralizámos o poder e não criámos regiões administrativas? Em quase toda a Europa, a democracia amadurece quando o Estado se aproxima dos cidadãos. Entre nós, resistimos décadas a dar esse passo.
Temos, é certo, as cinco CCDR - Norte, Centro, Lisboa e Vale do Tejo, Alentejo e Algarve. Mas falta o essencial: legitimar politicamente esse nível de governo, passando do nomeado ao eleito. O país já dispõe de Estado central e poder local, e tem regionalização de grau superior, autonómico, nas ilhas. Falta o Estado regional democrático no continente, com força, responsabilidade, escrutínio e ambição. O território está desequilibrado. O custo desse desequilíbrio paga-se em desertificação, serviços públicos desiguais, perda de talento, menor produtividade e fragilidade demográfica. É injusto para quem vive no interior; é pouco solidário com quem cria riqueza fora dos grandes centros; e é, pura e simplesmente, má economia. Revigorar a agricultura e as florestas, valorizar o turismo e o património, dinamizar as economias locais, exige decisões com conhecimento do território e com escala suficiente para coordenar políticas públicas.
Proponho que se dê o passo para governos regionais eleitos por assembleias regionais derivadas de eleições diretas (artigo 239.º da Constituição), com competências claras em transportes, saúde e ação social, educação e cultura, economia, agricultura e pescas, energia e ambiente, florestas e fogos rurais. O Estado central deverá manter as relações externas, a segurança e a defesa, as finanças públicas e a cobrança de impostos, bem como a justiça e o Parlamento nacional. Nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, executivos metropolitanos legitimados por assembleias metropolitanas eleitas devem gerir mobilidade, habitação, clima e inovação numa lógica policêntrica.
A arquitetura financeira é decisiva. Regiões com contratos-programa plurianuais, regras de responsabilidade orçamental e avaliação independente. Menos duplicações e mais clareza: integrar serviços desconcentrados nas novas administrações regionais, simplificando estruturas, reduzindo custos de contexto e encurtando o circuito da decisão. A proximidade melhora o serviço público e a "accountability"; a escala regional permite planear infraestruturas, especializar estratégias e captar investimento. A Madeira e os Açores mostram como a autonomia pode ser motor de desenvolvimento.
Este caminho deve assentar em princípios firmes: subsidiariedade (cada nível decide o que decide melhor), solidariedade (correções automáticas para evitar assimetrias), estabilidade financeira (sem aventuras), transparência (dados abertos, indicadores comuns) e avaliação (metas quantificadas de coesão, emprego e rendimento). O mapa é conhecido - o das cinco regiões - e o calendário pode ser faseado, com transição responsável.
Para completar a arquitetura institucional, defendo numa fase posterior, a criação de um Senado das Regiões, com senadores eleitos uninominalmente e igual número por região, incluindo Madeira, Açores e as áreas metropolitanas. Com sede numa cidade do interior. Portugal reforçaria assim a qualidade da democracia e do desenvolvimento.
A SEDES organizará, em abril de 2026, um conjunto alargado de conferências, com início no Porto, inteiramente dedicado a esta agenda, e espero que ao final se chegue com uma proposta concreta: mapa, competências, modelo eleitoral, financiamento, mecanismos de controlo, calendário. Cinquenta anos depois, não podemos contentar-nos com a retórica das efemérides.