Opinião

Trabalhar para aquecer

A disparidade salarial em função do género é de 17,5% em Portugal. Na prática, as mulheres trabalham mais dois meses por ano para receber o mesmo que os homens. Apesar de a realidade estar a melhorar, muito pouco, continua a ser fortemente penalizadora para elas, que trabalham 64 dias por ano para aquecer, de graça. A propósito destes dados do Observatório Género, Trabalho e Poder, ouvia uma mulher na rádio dizer que na fábrica onde estava desempenhava as mesmas funções que os homens, mas ganhava menos. Porquê? Tinha deixado de tentar compreender, porque, não havendo critério, diziam-lhe apenas que era assim. Também tinha deixado de lutar para alterar esta realidade que, mais que discriminatória, é penalizadora da capacidade de independência das mulheres. Há uma relação direta entre liberdade e dinheiro. Quando uma mulher tem maior capacidade financeira tem melhores condições para tomar decisões laborais e pessoais que impliquem mudanças. Sem essa capacidade, a dependência torna-se um fator decisivo à sobrevivência, baixa-se a cabeça quando a carteira está à míngua. A disparidade salarial, para lá da injustiça que encerra, condena as mulheres a vidas mais difíceis, de maior exclusão. Em Portugal, há quase um milhão de mulheres em risco de pobreza. Dados divulgados pela Comissão para a Igualdade entre Mulheres e Homens da CGTP mostram que aos baixos salários se juntam as baixas reformas e prestações sociais a que elas têm direito. Além dos fracos rendimentos, as mulheres são muitas vezes excluídas do mercado de trabalho em função da dedicação a que se obrigam com tarefas domésticas e cuidados familiares. Até junho de 2026, os estados da União Europeia têm de implementar uma medida que visa acabar com esta clivagem, mas Portugal está entre os países que menos fizeram para lá chegar.

Joana Almeida Silva