Praça da Liberdade

Um (mau) exemplo?

A presença de Cristiano Ronaldo na Casa Branca, integrado na comitiva que acompanhou o príncipe herdeiro da Arábia Saudita, levanta questões sobre a responsabilidade pública e o papel de uma das figuras mais influentes do desporto mundial.

O número 7 tem-se destacado, ao longo da carreira, tanto pela genialidade desportiva como pelos gestos solidários. Porém, essa mesma imagem tem-se vindo a desgastar ao tornar-se embaixador de um regime cuja reputação é incompatível com as causas humanitárias que abraça. É cada vez mais difícil conciliar a imagem do "embaixador da solidariedade" com o homem que se senta lado a lado com líderes responsáveis por violações brutais dos direitos humanos.

O príncipe herdeiro é presidente do fundo de investimento que detém a maioria do Al Nassr, clube onde Ronaldo joga. Este facto explica a proximidade, mas não justifica o alinhamento com um regime teocrático em que vigora a pena de morte, a discriminação das mulheres e o assassinato de opositores. Segundo a CIA, Bin Salman terá orquestrado o assassinato do jornalista do The Washington Post, Jamal Khashoggi.

O problema não está na visita de CR7 à Casa Branca, nem no encontro com Donald Trump. O problema está na cumplicidade com este regime autocrático. Segundo a Amnistia Internacional, entre 2014 e 2025 a Arábia Saudita executou 1816 pessoas, números que revelam uma realidade sombria por detrás da imagem progressista que o regime tenta projetar globalmente, agora com a ajuda de Ronaldo.

No meio desta máquina diplomática e financeira, Ronaldo é uma figura muito útil para os objetivos sauditas. A responsabilidade do internacional português não desaparece só porque não é político. A influência tem peso e o silêncio também. De um ídolo nacional, de alguém que conhece o valor e o alcance da própria imagem, esperava-se muito, muito mais.

Francisco Porto Fernandes