Praça da Liberdade

Do Douro ao Sena

Depois das emocionantes celebrações do espírito tripeiro, no seu melhor, com as evocações tão sentidas quanto emotivas do que designo por "Tomada da Bastilha", ou seja, o inesquecível motim portuense que salvou o Coliseu de se transformar numa ex-igreja universal que agora seria vendido, como o Vale Formoso, sabe bem saborear uns nacos de ironia e afirmação do orguho na cidade.

E, para isso, nada melhor do que gozar com os poderosos deste mundo e enaltecer o que é nosso ou, como se dizia quando se defendia e falava o bom português, "falar de cima da burra" para o considerado máximo da estranja. Foi o caso do saudoso dr. Fernando de Macedo Lopes, secretário da U.P. e versejador amador, que trocava com amigos franceses versos de afirmação do Burgo, entre os quais estes: "A nossa Torre tripeira / Ao ver da Eiffel os sabots / - Tu és, bradou zombeteira, / Simples versão em argot. // Burguesinha que se fica / De as fidalgas surpasser, / Não passas, torre futrica, / Da primeira nova rica, / Forjada pour epater". Em jeito de conclusão peremptória: "E dobrando o carrilhão / Rematou num grande grito: / Tudo o que diz é vão / Um velho e ilustre brasão / Assente sempre... em granito".

Noutra ocasião, a propósito dos rios das duas cidades, disse: "O Douro ao olhar o Sena / Teve esta frase escarninha: / - Corrente assim tão pequena / Cá em casa sobe à cena / Só em bancas de cozinha". Por estas e outras, um grupo portuense exilado em Paris diria que "Gostou tanto dos seus versos / Que reclama: Doutor, bis!" E aqui têm como, brincando com o quase intocável, se promove a cidade.

Helder Pacheco