Praça da Liberdade

O segredo cool do Bonjardim

Chamaram-lhe "cool" e a Time Out pô-la no 3.º lugar entre as ruas mais cool do mundo. Parece um troféu leve, coisa de revista. Mas "cool", numa rua, não é maquilhagem: é pulso, é cidade em modo íntimo, porque só é cidade a que está ao nível dos olhos e dos pés.

Uma rua cool segura vários tempos sem rasgar nenhum. A tradição não fica em museu e a novidade não chega de bulldozer. É espaço de conversa. E aqui há fricção boa: cheiro de pão quente ao lado do som de obras, a voz do vizinho a cruzar- se com o olhar de quem chega. E há acaso: encontros, surpresas, pequenas alegrias a meio do caminho. No Bonjardim, a mistura é visível e comestível: a Flor do Bonjardim adoça manhãs há décadas; o Pretinho do Japão, mercearia reinventada, prova que o comércio antigo pode ganhar futuro; a Regaleira serve o Porto de sempre, entre um Porto que muda; e as bifanas da Conga, com picante, mantêm fila, rumor e identidade.

Há também um lado quase secreto: esta rua é linha de continuidade, costura entre zonas e modos de vida, liga a Baixa turística ao Porto do dia-a-dia sem perder ninguém pelo caminho. Há pressa e pausa, quem passa e quem pertence, tudo no mesmo passeio. Por isso, o prémio faz sentido. O Bonjardim é cool porque é útil, diverso, habitado, numa rua onde a vida cabe. E uma rua só é realmente cool quando, nesta simbiose de usos e funções, se emite energia humana.

Agora vem a parte difícil: como continuar a sê-lo. Ser cool, depois de ser eleito, é um enorme desafio urbano. Não liga com lojas de souvenirs ou outros comércios globais. Exige cuidado fino de mobilidade, rendas, comércio, de quem fica e de quem chega, para que a etiqueta não mate a alma que a criou.

Paula Teles