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Filhos retirados a casal que vive em cabana remota numa floresta em Itália

Casal tem três filhos: uma menina de nove anos e os gémeos de seis Foto: Direitos Reservados

Três crianças foram retiradas dos pais, um casal anglo-australiano, com quem viviam numa casa numa zona florestal em Itália. A decisão judicial tornou-se um ponto de conflito político, onde existe um amplo debate sobre alegados excessos judiciais.

A primeira-ministra Giorgia Meloni, líder de um Governo de extrema-direita que defende os valores da família, estaria preocupada com o caso, que ocorreu perto de Chieti, na região leste de Abruzzo, onde a família vive isolada desde 2021.

Na quinta-feira, o tribunal de menores de Aquila, uma cidade próxima, suspendeu a responsabilidade parental do casal e ordenou a transferência das crianças para um abrigo com a mãe. O tribunal citou as precárias condições sanitárias da casa e o ensino doméstico não autorizado da filha de oito anos e dos gémeos de seis anos.

A decisão provocou uma onda de ataques verbais e ameaças online contra a juíza. Uma petição para "salvar a família que vive na floresta" já reuniu mais de 146 mil assinaturas.

O vice-primeiro-ministro italiano e líder do partido de extrema-direita Liga, Matteo Salvini, classificou as ações do juiz como "indignas, preocupantes, perigosas e vergonhosas", descrevendo-as como um "rapto" dos menores". "Juízes e assistentes sociais em Abruzzo, não sejam um incómodo", disse, apontando para a necessidade de uma reforma judicial.

"Crianças felizes e saudáveis"

Defendendo o seu estilo de vida como "sem stress" e em harmonia com a natureza, a australiana Catherine Birmingham e o britânico Nathan Trevallion disseram, este mês, à emissora nacional Rai que os filhos estavam a "crescer melhor" na sua casa na floresta.

Uma visita guiada à casa, concedida à Rai, mostrou um fogão a lenha na cozinha, camas infantis coloridas cobertas de peluches e luzes de Natal espalhadas pela casa. A eletricidade é fornecida por painéis solares, enquanto a casa de banho é compostável e está num barracão no exterior, onde um burro, um cavalo, cães, gatos, galinhas e patos circulam por uma clareira entre as árvores.

"As crianças estão felizes e saudáveis. Não fizemos nada de errado por querermos voltar à natureza", disse Birmingham à Rai.

Porém, os meios de comunicação locais noticiaram que as crianças não são vacinadas e não frequentam a escola, uma vez que os pais não apresentaram o pedido de ensino doméstico às autoridades locais.

Na tarde de segunda-feira, o Ministério da Educação emitiu um comunicado, afirmando que a secretaria regional de educação confirmou que "a escolaridade obrigatória tem sido concluída regularmente através do ensino doméstico", legal em Itália, segundo as agências noticiosas.

Os assistentes sociais foram chamados no ano passado depois de um dos filhos do casal ter ingerido cogumelos venenosos e ter sido levado para o hospital.

Fações políticas

O poder dos juízes tem gerado debates públicos em Itália, à medida que a principal reforma da justiça de Meloni, que inclui a separação das carreiras de juízes e procuradores, caminha para um referendo no próximo ano.

Os juízes têm criticado a interferência do governo, afirmando que a reforma irá restringir a sua independência, enquanto o governo acusa o poder judicial de parcialidade política.

As associações de magistrados defenderam a decisão do tribunal de Áquila de retirar as crianças da guarda da família e criticaram o que chamaram de exploração do caso para fins políticos.

"Rejeitamos qualquer forma de exploração expressa nos últimos dias por algumas fações políticas e pelos meios de comunicação social, que não consideram a complexidade e a sensibilidade dos direitos em causa", afirmou a Associação Italiana de Magistrados para Menores e para a Família.

Em comunicado, a associação observou que a decisão do tribunal ocorreu após um período de observação de um ano, "durante o qual as ordens do tribunal foram sistematicamente desrespeitadas pelos pais".

Na segunda-feira, o Conselho Superior da Magistratura (CSM), responsável pela independência judicial e por questões disciplinares, abriu um processo para proteger os magistrados em causa. O CSM afirmou que as recentes declarações de políticos "ultrapassam os limites da crítica legítima a um ato judicial e acabam por afetar diretamente o trabalho dos magistrados do Tribunal de Menores, expondo-os a pressões indevidas, inclusive através dos meios de comunicação social".

AFP