Opinião

Isentar camiões não chega

A construção da Via de Cintura Interna (VCI), rasgando a cidade do Porto, foi um erro grave, que expôs centenas de moradores ao ruído e à poluição ambiental permanente, dividindo quintas e devassando bairros. Há anos que se projetam soluções para tornar a autoestrada num espaço urbano de fruição pública. Ideias que não passam de exercícios urbanísticos e que, a cada dia vencido, se tornam mais irrealistas. Apesar do enorme investimento já realizado na rede de transportes públicos (e que deve prosseguir), a VCI só soma trânsito. Falar em hora de ponta é uma miragem, pois os automóveis e os camiões acumulam-se muito para além das tradicionais 7 às 10 e 16 às 19 horas. Em média, circularam 132,6 mil veículos por dia em 2024, mais 2400 viaturas diárias do que em 2023 e mais sete mil do que em 2022. A eliminação das portagens na Circular Regional Exterior do Porto (CREP) é uma boa notícia que tarda. Ao Governo, só cabe cumprir a vontade da Assembleia da República e avançar com a isenção total sem limitação horária para os pesados. Embora restringir a discussão aos camiões seja insuficiente. Aliás, olhando só para os pesados, tenho dúvidas de que o fim das portagens na CREP tire, só por si, os camiões da VCI. Os empresários farão contas e receio que muitos não estarão disponíveis para gastar mais em combustível, optando pelo trajeto mais curto. Para ser eficaz, a medida deveria ser acompanhada da proibição de circulação de camiões TIR na via que cruza a cidade. Acresce que a maioria do trânsito na VCI é de automóveis e permitir que também os automobilistas possam circular sem custos na CREP contribuirá em muito para descongestioná-la. Talvez então se possa começar a pensar em dar corpo a medidas mais ousadas, como proibir a entrada de carros em algumas zonas da Invicta, e tirar as ideias dos arquitetos e dos urbanistas do papel para ali voltar a fazer cidade.

Carla Sofia Luz