Praça da Liberdade

Na era da engenharia da opinião

Na capa sombria desta semana da revista "Nouvel Obs", emerge a vermelho o título "profissão: propagandista". O sujeito retratado é Pascal Praud, antigo jornalista de desporto francês que hoje assume um papel central como comentador no grupo Bolloré, um conglomerado cujo peso no espaço mediático francês é avassalador. O extenso artigo mostra que a ascensão de Jordan Bardella, a nova estrela do partido de extrema-direita União Nacional, corresponde em parte a uma apurada estratégia de comunicação moldada através de perceções criadas no seio deste grupo.

Segundo a "Nouvel OBS", a transformação do grupo Bolloré (proprietário do bem-sucedido canal de informação CNews, da rádio Europe 1, do semanário "Journal du Dimanche" e da bem conhecida holding de publicidade Havas) numa rede de comunicação orientada para uma agenda política não corresponderá a uma simples opção editorial, mas, acima de tudo, ao desenvolvimento de um ecossistema em que a opinião substitui a informação, criando uma realidade que se vai construindo sem uma correspondência em relação àquilo que se retrata. Não é caso isolado. Em França, Pascal Praud é, segundo a revista, o símbolo perfeito desta mutação. Como se explica no extenso artigo, a sua omnipresença em vários meios do grupo, multiplicada por outros comentadores clones, cria a perceção de um país permanentemente à beira de colapso, ameaçado por inimigos internos e externos e, por isso, a precisar de salvação. Os perigos são vários. Por exemplo, de fora, a imigração constitui um sério problema que urge combater; dentro de fronteiras, os canais de serviço público de média são um obstáculo que é preciso derrubar.

Nesta visão do Mundo e do país, Jordan Bardella encaixa-se na perfeição como o salvador de uma pátria a precisar rapidamente de outro rumo. Esta engenharia de opinião meticulosamente disseminada, quer por redes sociais quer pelos média tradicionais, desenvolve-se tão depressa quanto de forma subtil em várias geografias. Em França, o principal foco são as eleições presidenciais de 2027 para as quais se procura moldar uma opinião pública em torno de determinada força política.

Por cá, estamos ainda longe deste modelo sofisticado de comunicação, mas há sinais que se sentem cuja leitura deve ser clara, a fim de que a adesão a eles seja feita de modo consciente e não através de uma bem calculada manipulação. Neste contexto, importa manter a vigilância e reforçar a exigência crítica para que a opinião pública não se deixe moldar por estratégias discretas e eficazes. E, claro, importa também defender o jornalismo, a fim de que este campo continue a ser um meio de esclarecimento e não um chão onde se erguem armas ao serviço de qualquer projeto político.

Felisbela Lopes