Praça da Liberdade

Piegas de Natal

Estão histéricos com o Natal? Aposto que não tanto como o Chega. Eu quero concentrar-me na lista dos presentes de Natal e não consigo porque aparece um deputado do Chega aos berros a dizer que estão a cancelar o Natal. Pedro Frazão, como é que podem estar a cancelar o Natal se o Continente lançou um cupão de desconto em toda a carne de peru? Pedro, calma! É que é um tema mesmo, mesmo importante. Caso contrário, no dia da greve geral, que paralisou grande parte dos trabalhadores e resultou numa enorme mobilização em vários pontos do país, o líder do partido de extrema-direita não tinha usado as suas redes sociais para exprimir a sua grande preocupação do dia "Vamos denunciar todas as festas de Natal que estejam a ser canceladas com receio de incomodar os imigrantes de outras religiões ou culturas! Mas o que é isto?!". Não sei, André. Ninguém sabe do que é que estás a falar. É difícil opinar sobre um fenómeno que não existe, percebes?

Eu confesso que até fiz uma pesquisa na Internet, para encontrar este ror de casos - porque sabe-se lá se não há um dia que acertam - e foi um desastre. Entrei no motor de busca e lá escrevi "escolas portuguesas feliz Natal", resultados: "Chegada do Pai Natal a escolas da freguesia do Caniço". Tenho de pesquisar de outra maneira. "Escolas Portugal boas festas feliz Natal": Pumba! Só publicações de várias escolas portuguesas a desejar um feliz Natal com fotografias do Conselho Diretivo com barretes giros. No desespero, escrevi até "escolas proibidas de desejar feliz Natal" e o máximo que encontrei foi uma série de vídeos da deputada do Chega Rita Matias a dizer que anda por aí uma epidemia de cancelamentos do Natal em escolas públicas e uma notícia do jornal "Público" a dizer que as pessoas que dizem que anda por aí uma epidemia de cancelamentos do Natal em escolas públicas estão descaradamente a mentir. Portanto, ou há uma cabala a envolver a Comunicação Social inteira para abafar estas notícias ou é o 20 939° histerismo do partido de extrema-direita. Agora, vamos acreditar em quem, não é verdade?

É que, não levem a mal, mas se há um grupo de pessoas que podíamos dizer que não são os maiores embaixadores do Natal, é este. Desculpem. O Natal trata-se do nascimento de uma criança em Belém porque a sua família estava a ser perseguida politicamente. E, como nessa noite foi impossível para esta família do Médio Oriente arranjar um sítio, possivelmente devido à gentrificação na Cisjordânia, acabaram alojados numa gruta, sem as mínimas condições. Agora, querem-nos convencer de que são eles os que mais apreciam a cena da natividade. Eu nem quero imaginar a campanha eleitoral que o Chega faria ali para os lados de Jerusalém: "Isto não é a Nazaré! Voltem para a Galileia!" ou "Tira o teu puto castanho da minha manjedoura".

Eu assumo já. Eu digo sempre boas festas. E não é por autopoliciamento da linguagem, é porque sou uma pessoa prática. Boas festas fica já tudo despachado. Natal, passagem de ano. Está tudo. Com jeitinho até dá para o próprio aniversário, se fizer anos entretanto. É que eu não sei se vou voltar a ver esta pessoa até à passagem de ano, portanto, dou-lhe já tudo. Sabem quem é que também prefere dizer boas festas a dizer feliz Natal? O meu tio que foi o primeiro da família a assumir que vota no Chega. Remata sempre com "pelo corpo todo!". Eu diria que não vale a pena intelectualizar este assunto. Já viram o que seria se as pessoas deixassem de dizer boas festas? Perdiam-se estes momentos de requinte.

Cátia Domingues