Justiça

Agentes da PSP do Porto "agiram de forma errada, censurável e criminosa", acusa MP

Julgamento decorre no Tribunal de São João Novo, no Porto Foto: José Carmo / Arquivo

O Ministério Público (MP) pediu esta manhã de segunda-feira, no Tribunal de São João Novo, no Porto, a condenação de três agentes da PSP acusados de ficar com dinheiro e drogas apreendidas a traficantes para depois as dar a informadores. Os advogados de defesa de dois dos acusados alegaram várias irregularidades na investigação e pediram a absolvição dos seus clientes.

"Por vaidade pessoal ou interesses económicos sei que [os três agentes] agiram de forma errada, censurável e criminosa", acusou o procurador Rogério Osório, pedindo a condenação destes arguidos que, com a sua conduta puseram "em crise a segurança de todos nós e a relação de confiança com o Estado".

Nas alegações finais, o procurador comparou a atitude destes três agentes, em prisão preventiva desde julho de 2023, com "o que se dizia há alguns anos dos autarcas: rouba mas faz". Porém, "é inadmissível" e "os fins não justificam os meios", frisou o procurador Rogério Osório. "Não podemos aceitar nos quadros polícias que, com o seu comportamento, põem em causa milhares de outros agentes e enfraquecem o Estado. A sua condenação mostrará que, para o Estado democrático, não vale tudo", antecipou.

Para o procurador, ficou provado em tribunal que os três agentes da Brigada de Fiscalização da PSP do Porto cometeram quase todos os crimes dos quais vinham acusados: entraram em residências e efetuaram buscas sem autorização e sem mandado, apropriaram-se de estupefacientes para depois os entregar em troca de informações, ameaçaram e agrediram suspeitos e falsificaram documentos, entre outras ações ilegais.

Já quanto ao subcomissário também acusado no processo, o procurado não pediu a sua condenação, mas também não chegou a pedir a sua absolvição. Antes deixou o seu destino à avaliação do tribunal.

O advogado do subcomissário Ismael C. lembrou que todos os arguidos negaram que o seu cliente tivesse conhecimento "do que quer que seja"e sublinhou que não houve qualquer prova da sua intervenção em algo ilícito. As duas únicas menções são de um informador que admitiu que, a pedido dos agentes, lhe mentiu e do responsável pela investigação a dizer que o sub-comissário entregou o seu telemóvel sem sequer ser ainda arguido ou suspeito. "Teria alguma lógica ele fazer isso se fosse culpado?", questionou Ricardo Serrano Vieira.

MP fez fato à medida

Ainda sobre o telemóvel, o causídico fez questão de denunciar a existência de "uma quebra na cadeia de custódia de prova", acusando o responsável da investigação ou a empresa que extraiu as mensagens de as retirar do contexto em que foram proferidas que "é completamente diferente" do afirmado pela acusação. "O MP fez um fato à medida e andou a apertar a costura à medida do freguês", sustentou.

Para Ricado Serrano Vieira"não há uma única prova de que o seu cliente praticou os factos". Aliás, "a prova não é omissa; é contárária daquilo que diz a acusação". Por fim, o advogado fez questão de lembrar que nenhum dos crimes que deram início à investigação está no catálogo de crimes que permite as escutas efetuadas e que, por isso, não poderão ser valoradas pelo tribunal.

Início de inquérito "precipitado, não fundamentado e de forma ilegal"

Também a advogada de Hugo S., acusado de 60 crimes, contestou a abertura do inquérito baseada em "boatos, rumores e depoimentos produzidos em surdina por pessoas não identificadas e indivíduos ligados ao tráfico de droga". Este processo iniciou-se "de forma precipitada, não fundamentada e de forma ilegal" com escutas telefónicas, escutas ambientais e geolocalização quando nenhum dos crimes de que era suspeito Hugo S. no início do processo admite este meio de prova, sustentou Maria Candal.

Hugo e outros agentes estão acusado de se apropriarem de mochilas com o produto da venda de estupefacientes e com os próprios estupefacientes que davam a outros traficantes, que deixavam em paz, mas "nada disto se provou", defendeu a causídica. "Se há coisa que se mostrou inequívoca é que nenhum dos arguidos retirou quaquer proveito da sua atuação. Nem um tostão. O que motivou a sua conduta não foi nunca a perspetiva ou intenção de obtenção de qualquer ganho, lucro ou dinheiro, mas, sim, a obtebção de resultados no exercício das sua funções, assim como a obtenção da maior quantidade possível de droga", terminou Maria Candal.

As alegações dos advogados dos outros dois agentes da PSP irão ocorrer no próximo dia 6 de janeiro. Os arguidos estão acusados dos crimes de denegação de justiça, favorecimento pessoal praticado por funcionário, peculato, abuso de poder, falsificação de documento, coação agravada, sequestro agravado, ofensa à integridade física qualificada, detenção de arma proibida e falsas declarações.

Hugo S. e um comerciante estão ainda acusados de falsificar cinco autos de contraordenação, por excesso de velocidade, identificando um condutor, residente em Madrid, diferente do real infrator. O polícia terá ainda replicado este esquema noutros dez autos, relativamente a um infrator que não foi possível identificar.

Tiago Rodrigues Alves