Hunter Halder, fundador do projecto Re food, nasceu há 60 anos na Virginia, Estados Unidos da América. Foi numa peregrinação a Fátima, há cerca de 30 anos, que se apaixonou pela guia turística, portuguesa, com quem havia de casar, anos mais tarde. A mudança para Lisboa aconteceu assim normalmente.
A ideia do projecto Re food surgiu-lhe num jantar de buffet com os seus filhos, correcto?
Sim. Era um buffet normal, mas no final quando o meu filho me perguntou qual o destino daquela comida toda que sobrava, respondi que teria de ir para o lixo, porque não havia grandes condições para a guardar. Depois, ele próprio foi trabalhar num hotel de Lisboa e chegava a casa zangado com a quantidade de comida que se estragava diariamente. Aí comecei a pensar nesta ideia
Seguiu-se o trabalho de campo...
Sim, comecei a pensar na ideia, a fazer o levantamento dos restaurantes disponíveis, a pensar qual seria a atitude dos proprietários, a estudar eventuais obstáculos legais, e percebi que o primeiro esforço teria de ser mudar atitudes para vencer obstáculos.
E aproveitou o trabalho que já estava feito antes...
Sim, foi importante todo o papel do piloto António Costa Pereira, que escreveu muito sobre a necessidade de aproveitar sobras, que obteve grande apoio das pessoas em geral, nomeadamente no Facebook. Esta força pública mudou mentalidades e chegou-se à conclusão que nada impedia que se distribuíssem sobras.
O projecto arrancou quando, pela primeira vez?
No dia 9 de Março deste ano. No primeiro mês tivemos 30 voluntários, depois foram saindo as notícias e chegou cada vez mais gente. Hoje temos mais de 80 e com tendência para crescer. E, em seis meses, já distribuímos mais de seis mil refeições.
E têm encontrado muitas situações de fome em Lisboa?
A fome aqui não é como em África, óbvio. Aqui lidamos, sobretudo, com aquela pobreza que envergonha. As pessoas têm rendimentos muito baixos e têm de fazer a opção entre comprar medicamentos ou comer...
Há interesse de outros movimentos da Sociedade Civil em copiar o projecto noutros pontos do país. O que é preciso para implantá-lo?
Um restaurante, um voluntário e uma família que precise de comida. Esta é a base, depois é desenvolver.
Há também pessoas que recebem apoio mas não dão a cara, por vergonha, os chamados "clandestinos". Como se processa a ajuda nestes casos?
É verdade. Nem os voluntários as conhecem. Levamos as refeições, tocamos à porta do prédio, e deixamos lá as caixas que as pessoas vêm depois recolher sem nunca revelarem a sua identidade.