Duas pessoas, paralisadas, conseguiram beber pela primeira vez sem ajuda, graças a um braço artificial que controlaram com o cérebro. Implante no cérebro comunicou com a máquina, que lhes levou a garrafa à boca. Veja o vídeo.
A ideia ocupou os cientistas durante anos: "Se os impulsos cerebrais são elétricos têm de poder traduzir-se numa máquina".
Durante muitos anos de trabalho foi esta a linha, sempre aperfeiçoada e testada, de uma investigação financiada pelo Instituto Nacional de Saúde dos EUA, que tinha como objetivo a construção de interface cérebro-computador.
O projeto, batizado com o nome de "Braingate" -, a porta do cérebro, em inglês -, foi publicado na revista científica "Nature", esta quarta-feira.
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Um pequeno dispositivo, do tamanho de uma aspirina infantil, foi inserido no cortex motor do cérebro, a zona que controla os movimentos. O aparelho contém perto de uma centena de pequenos elétrodos com a espessura de um cabelo, capazes de captar os sinais elétricos produzidos pelo cérebro.
A informação é depois transmitida a um recetor, onde o programa a traduz em ordens para um braço artificial. Foi desta forma que os dois voluntários, tetraplégicos, um homem e uma mulher, conseguiram agarrar uma garrafa e levá-la à boca. Algo que há anos não conseguiam fazer pelos seus próprios meios.
Em 12 de abril do ano passado, Cathy Hutchinson, de 58 anos, fez história ao usar exclusivamente a força do pensamento para fazer um braço mecânico agarrar uma garrafa com café sobre uma mesa, erguê-la e levá-la aos seus lábios para beber, anunciaram os cientistas, esta quarta-feria.
"Esta foi a primeira vez em quase 15 anos que ela foi capaz de pegar algo exclusivamente com sua própria vontade, e o sorriso dela, quando conseguiu, foi algo que eu, e sei que toda a nossa equipa de pesquisa, nunca esquecerei", disse o neurologista Leigh Hochberg por teleconferência.
A mulher, de 58 anos, paralisada devido a um AVC, há 16 anos, tem o microchip implantado há cinco anos. O outro voluntário é um homem de 66, também paralisado e vítima de AVC há oito anos. Ambos se sujeitaram a um intenso programa de treino até aprenderem a pensar de maneira a que o dispositivo entendesse as ordens e fosse capaz de as traduzir.
Já outras experiências anteriores tinham conseguido que pessoas com paralisia conseguissem mexer um cursor de um computador. O "Braingate" permite, agora, a realização de movimentos mais complexos e tridimensionais.
"Pensamos em avançar na tecnologia de forma que algum dia também consigamos religar o cérebro diretamente ao próprio membro de uma pessoa ou ligar o cérebro a uma prótese", disse o neurocientista John Donoghue.
O processo de aprendizagem, além do custo financeiro, torna atualmente o sistema pouco aplicável de uma maneira generalizada. Cada um dos voluntários necessitou de meses de treino, acompanhado por um cientista que ajudou a calibrar o aparelho.
"Alcançaremos a nossa meta quando alguém que perdeu a mobilidade por causa de uma lesão neurológica ou doença consiga interagir completamente em seu próprio ambiente sem que ninguém tenha conhecimento de que está a usar um interface cérebro-computador", acrescentou Donoghue.
Algo que pode acontecer em "menos de uma década", afinaçou aquele neurocientista.
Para poder usar a técnica, os doentes não podem ter lesões na parte do cortex na qual se insere o dispositivo, uma vez que estas tornam impossível a transmissão dos sinais.