Todos os anos o Inverno leva à urgência dos hospitais milhares de pessoas com sintomas mais extremos de gripe. Quem vive o dia-a-dia dos centros de saúde e a sua relativa ineficácia fora de horas sabe porque razão as pessoas recorrem tanto à urgências. Sem estruturas intermédias a funcionar de forma eficaz, o problema não tem solução à vista. Esperar por esperar, ao menos que seja num local bem equipado para exames de diagnóstico - quando estes são necessários.
Junta-se a isto factores mais subjetivos como a desinformação ou preconceito quanto aos Centros de Saúde, o medo mesmo em sintomas banais ou a dificuldade no atendimento, fora de horas laborais ou ao fim-de-semana, dos médicos de família. A gripe acaba por ser o mais simples e evidente exemplo do muito que ainda há por fazer do Serviço Nacional de Saúde.
[perguntas]
[1] O baixíssimo índice de mortalidade infantil, em parte devido à visão de Albino Aroso, pode ser posto em causa pelos cortes sistemáticos no Serviço Nacional de Saúde?
[2] Que alternativas aos brutais entupimentos das urgências e dos internamentos hospitalares nesta altura do ano provocados pelos surtos de gripe?
António Ferreira, presidente do conselho de administração do Hospital de S. João
[1] Portugal é um dos países da OCDE com recém-nascidos de mais baixo peso - factor determinante do índice. As políticas de saúde e social têm de se focar neste problema.
[2] As consequências da sazonalidade são mais ou menos empoladas em função do ambiente político-social. Enquanto não se reformar radicalmente a política de recursos humanos no sector público e não se apostar na centralidade dos médicos de família não haverá capacidade para lidar com a mesma sazonalidade.
Isabel Vaz, presidente da comissão executiva da Espírito Santo Saúde
[1] A nossa taxa de mortalidade infantil é um ganho em saúde consolidado, resultado de uma reforma estruturante e eficaz do nosso sistema de saúde. Não me parece que possa ser posta em causa pela crise que o país atravessa.
[2] Uma verdadeira reforma dos cuidados primários de saúde. A verdade é que continuamos a ter mais de metade de atendimentos não urgentes nas Urgências hospitalares, que deveriam ser resolvidas pelos centros de saúde e não são.
Manuel Antunes, cirurgião toráxico e professor da Universidade de Coimbra
[1] Penso que não. O acesso das grávidas à assistência médica, especialmente nas maternidades, não tem sido, no essencial, afectado. Além do mais, os custos envolvidos não são elevados. E também pela baixíssima taxa de natalidade que infelizmente temos.
[2] Verdadeiramente, não há alternativa, já que estes casos necessitam mesmo de atendimento especializado urgente. A situação poderia ser minorada com uma campanha que convencesse os que não necessitam a não ir à urgência!
Nuno Sousa, diretor do curso de Medicina da Universidade do Minho
[1] Em primeiro lugar uma palavra de reconhecimento à coragem e visão do Dr. Albino Aroso - um verdadeiro construtor de um Portugal com mais Saúde a quem milhares de portugueses devem a vida! (Nota: Também há heróis em Portugal para além do futebol!) Em segundo lugar para dizer que o seu legado impressionante, que nos colocou ao nível dos melhores, terá de ser continuamente preservado - é um imperativo civilizacional.
[2] A missão das instituições prestadoras de cuidados de saúde é assegurar o atendimento aos doentes. Daí que seja relativamente intuitivo que, em situações especiais de afluxo, haja uma flexibilização de horários para otimizar os recursos de atendimento e satisfazer as necessidades.
Maurício Barbosa, bastonário da Ordem dos Farmacêuticos, prof. da Fac. de Farmácia da U. Porto
[1] Não me parece que estejamos nesse ponto. A mortalidade infantil é um indicador de saúde de que o País muito se deve orgulhar e assim deverá manter-se.
[2] É algo recorrente. Antes de mais, é um problema de falta de organização do sistema, que os responsáveis não têm conseguido resolver. O reforço dos cuidados primários de saúde e o melhor aproveitamento das unidades de proximidade, como as farmácias, muito poderão contribuir para um sistema bem mais eficiente.
Purificação Tavares, médica geneticista, CEO CGC Genetics
[1] É de toda a justiça referir sempre o trabalho pioneiro do Dr. Albino Aroso, e o seu legado importantíssimo em termos de Família, Sociedade e Saúde Pública.
[2] É fundamental reforçar que o atendimento de proximidade, nos Centros de Saúde, tem de ser mais usado por todos, de forma a libertar os centros diferenciados para os casos mais graves.
Paulo Mendo, antigo ministro da Saúde
[1] Claro que não. Trata-se de um programa que teve e tem em vista uma mudança de comportamentos das famílias e das mães e não obriga a nenhuma aumento considerável, e muito menos brutal, das despesas. O país felizmente assimilou esta cultura, graças à excelente execução do programa.
[2] Não houve nenhum entupimento brutal das urgências e internamentos provocado pela gripe sazonal. Trata-se de um fenómeno frequente nesta altura do ano para o qual os serviços estão preparados.