Saúde

Medicamentos baratos ameaçados pela crise

As notícias que deram conta da falta de medicamentos, há algumas semanas, continuam atuais? O Barómetro Saúde JN quis ouvir a opinião de quem trabalha próximo dos doentes para compreender se há ou não escassez deste elemento terapêutico essencial. Entre outras, destaque para a resposta do bastonário dos farmacêuticos: "Nas farmácias, as faltas de medicamentos são do domínio público. Afectam em especial os de preço mais baixo. É um lamentável dano colateral da forte redução de preços ocorrida nos últimos dois anos".

Esta circunstância traduz-se numa perda de qualidade de vida de muitos cidadãos. Apesar dos esforços já feitos, sem uma boa regulação do mercado do medicamentos (que não se trata apenas de um 'mercado') fica por resolver esta questão quase subterrânea, mas importantíssima, da sociedade portuguesa.

[perguntas]

[1] Na sua experiência quotidiana tem detectado situações de falta sistemática de medicamentos? Em alguma patologia em especial? O preço influencia esse facto?

[2] Os rankings elaborados por entidades públicas que avaliam a eficiência dos hospitais revelam os melhores. Devia-se tornar pública a lista sem omissão dos hospitais pior classificados?

[respostas]

António Ferreira, presidente do Conselho de Administração do Hospital de S. João

[1] Não existe falta sistemática de medicamentos. O que existe é uma política de aprovação de novos medicamentos que está, felizmente, a mudar.

[2] Sim. No caso do Centro Hospitalar de São João, o qual apresenta a menor mortalidade, a serem verdadeiros os resultados do estudo em relação às complicações deveria de imediato determinar-se uma auditoria externa porque esses resultados seriam inaceitáveis.

Isabel Vaz, presidente da Comissão Executiva da Espírito Santo Saúde

[1] Se a pergunta se refere aos serviços farmacêuticos das unidades que a Espírito Santo Saúde possui pelo país, a resposta é não. Sobre o que se passa nas farmácias de oficina, não tenho informação suficiente para comentar a situação.

[2] O benchmarking divulgado regularmente pela ACSS (Administração Central do Sistema de Saúde) com os resultados dos hospitais, em diferentes parâmetros, não deixa nenhum de fora. É o melhor ranking que conheço.

Manuel Antunes, cirurgião toráxico e professor da Universidade de Coimbra

[1] Trabalho exclusivamente em meio hospitalar e o fenómeno passa-me um pouco ao lado, mas os doentes não se têm queixado. O problema parece limitar-se a pequenos nichos de doentes e patologias, de muito impacto para os próprios mas sem repercussão global.

[2] A eleição dos melhores, condicionada pelo tipo de factores avaliado, é estimulante para os próprios e os seus profissionais. Elencar os piores deveria estimular a melhoria mas o impacto nas populações seria devastador.

Paulo Mendo, antigo ministro da Saúde

[1] Como reformado a minha atividade atual é muito pequena. Infelizmente fui naturalmente envolvido no seguimento de vários familiares com tratamentos especializados e de administração rigorosa e não senti mais dificuldades na sua obtenção. Naturais dificuldades, nem percebidas em situação social normal são ampliadas em época de crise pela comunicação social ( a grande predadora) e pela ansiedade popular.

[2] "Ranking" sugere vencedor e vencido, bom e mau, primeiro e último. Não é isso que o trabalho da ENSP pretende mostrar, mas à luz das respostas a determinadas quesitos mensuráveis, quais os Hospitais que nesse ano, melhor se comportaram num universo de bons. Parabéns a esses hospitais mas não concluam precipitadamente que os outros são instituições "falhadas".

Nuno Sousa, diretor do curso de Medicina da Universidade do Minho

[1] Sim, há falta sistemática de fármacos em várias áreas, aspeto onde não se têm verificado melhorias significativas.

[2] Independente do seu valor intrínseco, o acesso à informação coletada deve ser feito na íntegra. Tal como é feita, a sua divulgação não gera informação suficiente (e por conseguinte, gera especulação), o que não beneficia ninguém.

Purificação Tavares, médica geneticista, CEO CGC Genetics

[1] Não tem chegado ao meu conhecimento.

[2] Claro, a transparência e a verdade são um bem, uma forma de estar que deve ser valorizada entre nós. Os resultados menos bons no desempenho e avaliação da eficiência também são um estímulo para evoluir e corrigir os problemas identificados. E, não esquecer, dentro de um hospital de menor ranking haverá certamente profissionais e serviços muitos bons.

Maurício Barbosa, bastonário Ordem dos Farmacêuticos e prof. da Fac. Farmácia Univ. Porto

[1] Nas farmácias, as faltas de medicamentos são do domínio público. Afectam em especial os de preço mais baixo. É um lamentável dano colateral da forte redução de preços ocorrida nos últimos dois anos. Nos hospitais, apesar do ruído de fundo, o que há é maior rigor na prescrição e na dispensa dos medicamentos, que, neste caso, têm preços muito altos.

[2] Não menosprezando os rankings, que devem ser olhados com cautela, importa avançar com a reforma hospitalar e do sistema de saúde.