Saúde

Aborto e Centros de Saúde: os custos, claro

Quando a maioria PSD/CDS voltou a colocar a questão do caráter gratuito da prática de abortos nos hospitais públicos, abriu-se de novo a porta a discussões extremadas na sociedade portuguesa. É quase como voltar ao momento do referendo: as mulheres que praticam a interrupção voluntária da gravidez fazem-no de forma inconsciente? Estabelecer um preço é uma forma de fomentar melhor planeamento familiar?

O número de abortos ligar-se-á, seguramente, com a qualidade e acesso a centros de saúde. Os novos modelos de gestão pareceram operacionalizar melhor a relação com os utentes, nomeadamente fora das horas laborais. Mas o Tribunal de Contas critica alguns dos custos e a forma como foram feitos pagamentos a algumas categorias de funcionários. Ora, pode uma boa ideia cair por terra por questões administrativas?

[1] Deve acabar a isenção de taxa para quem recorre à prática de aborto em hospitais públicos?

[2] O Tribunal de Contas criticou horas extraordinárias do novo modelo de gestão de algumas Unidades de Saúde Familiar. Concorda?

[respostas]

Manuel Antunes, cirurgião toráxico e professor da U. Coimbra

[1] Sim. Eu sempre tive reservas acerca deste programa, mas aceito a necessidade em algumas circunstâncias. Tenho defendido uma redução significativa das isenções das taxas moderadoras e parece-me um contra-senso que estes casos estejam isentos e os utentes de programas de fertilidade tenham de pagá-las.

[2] Talvez não. As horas extraordinárias são um mecanismo de compensação que deve ser usado criteriosamente, mas com um papel valiosíssimo na compensação de deficiências de pessoal. Portanto, devem ser utilizadas (e pagas) quando se justificarem, o que deve ser determinado pelos directores de Serviço/USF. Naturalmente, os excessos (e parece que os houve, não nas horas mas nos prémios de desempenho) têm de ser verificados e condenados se for o caso, e essa é uma função do TC.

António Ferreira, presidente do Conselho de Administração do Hospital de S.João

[1] O valor inviolável da vida não se discute em termos de taxas moderadoras.

[2] Não quero, no momento, comentar publicamente os relatórios do Tribunal de Contas sobre as questões da Saúde.

Isabel Vaz, presidente da Comissão Executiva da Espírito Santo Saúde

[1] Deve acabar a isenção, pelo menos no caso de sucessivas IVG pela mesma mulher.

[2] Trata-se de um relatório preliminar, como já veio esclarecer o Tribunal de Contas. Mas, a confirmar-se essa avaliação, é mais um sinal de que é preciso revisitar a reforma dos cuidados de saúde primários.

Maurício Barbosa, Bastonário da Ordem dos Farmacêuticos e prof. da Faculdade de Farmácia da U. Porto

[1] Defendo a existência de mecanismos diferenciadores das situações nesta matéria.

[2] Por princípio, defendo que as horas extraordinárias sejam permanentemente

sujeitas a rigorosíssimas triagens.

Nuno Sousa, diretor do curso de Medicina da Universidade do Minho

[1] A decisão de interromper a gravidez é uma por si só difícil. A Lei portuguesa consagra a sua prática nas melhoras condições possíveis. Não vejo portanto razão para terminar com a isenção de taxa.

[2] A questão crítica é avaliar se a realização de horas extraordinárias era, ou não, uma necessidade para suprir as necessidades

Paulo Mendo, antigo ministro da Saúde

[1] Portugal deve ser dos poucos países no Mundo que tornaram gratuito e sem qualquer taxa moderadora o aborto nas primeiras dez semanas da gravidez, por mera decisão da interessada e sem que as autoridades possam sequer tentar propor uma alternativa. Tudo em nome de um sacrossanto direito que os políticos discutem, deixando que o País se torne um albergue de idosos, um deserto de crianças, um cemitério de velhos e de abortos!

[2] Não, mas cada vez a Política tem menos autoridade.

Purificação Tavares, Médica Geneticista, CEO CGC Genetics

[1] A interrupção voluntária da gravidez é um direito. O modelo atual funciona, não vejo razão para alterar. Mas as politicas de educação para prevenção devem continuar a ser absolutamente prioritárias.

[2] Trata-se ainda de um relato dos auditores, pelo que devemos esperar pelo documento final para analisar as razões e conclusões.

Redação