Saúde

O valor da saúde privada portuguesa

A queda colossal do Grupo Espírito Santo abriu porta a mais uma rutura no mercado. A Espírito Santo Saúde (ESS) está à venda, ao melhor comprador, porque só há uma saída: não deixar fechar um dos mais importantes e valiosos conglomerados do setor em Portugal. Ficará na mãos dos mexicanos da Angeles? Ou dos Mellos, que representam o outro grande grupo rival, a CUF?

Ser ou não português o detentor do capital é uma questão que não é um obstáculo para a maioria dos membros do Barómetro JN embora, Nuno Sousa, da Universidade do Minho, diga que "a gestão por quem já conhece o sistema de saúde português parece-me preferível". Manuel Antunes, do Hospital da Universidade de Coimbra chama à atenção para o problema dos monopólios - questão que tem sido colocada quanto a uma eventual fusão do Espírito Santo Saúde e da CUF.

A reorganização dos "players" da saúde privada é um assunto tremendamente importante na atual conjuntura dada a pouca robustez do mercado neste momento. Discute-se desde há algum tempo se haverá um excesso de hospitais privados em Portugal e não é a mesma coisa haver um reforço dos Mellos (com o inevitável enfraquecimento ou fecho de algumas unidades do ESS) ou a entrada de um grupo forte e capitalizado em Portugal capaz de gerar ainda mais concorrência. É certo desde já que nada ficará como dantes.

[perguntas]

[1] O ministro da Saúde propõe um acordo político de fundo quanto ao Serviço Nacional de Saúde para aumentar as receitas do sistema. Concorda?

[2] A venda da Espírito Santo Saúde a um grupo português ou estrangeiro altera alguma coisa no mercado da saúde em Portugal?

[respostas]

Manuel Antunes, cirurgião torácico e professor da Universidade de Coimbra

[1] O acordo/pacto de regime há muito é devido. O SNS não se compadece com as frequentes mudanças de rumo de sucessivos ministérios. Quanto ao financiamento, há que encontrar soluções rapidamente, porque o atual sistema não é sustentável a médio prazo. Continuo a insistir na comparticipação direta pelo utente

[2] Penso que não, desde que o comprador esteja disposto a manter as atuais instituições e se comprometa a cumprir as nossas regras. Porém, há que ter atenção aos monopólios.

Mauricio Barbosa, bastonário da Ordem dos Farmacêuticos e prof. da Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto

[1] Considero da maior importância. Há muitos anos que a necessidade de reformas estruturais no setor da saúde é por de mais evidente e pede acordos políticos. Especialistas não vêm afirmando outra coisa. E desde que presido à Ordem dos Farmacêuticos também tenho levantado e insistido nesta questão.

[2] Acima de tudo, o que importa é que o grupo adquirente seja idóneo, tenha sólidas provas dadas, garanta a qualidade dos cuidados de saúde prestados e prossiga o progresso da ESS.

Nuno Sousa, diretor do curso de Medicina da Universidade do Minho

[1] Não conheço os detalhes do acordo proposto, mas por princípio entendo que a Saúde não pode ser gerida por ciclos (ou agendas) partidários e como tal, acordos abrangentes são bem-vindos.

[2] Em princípio não altera, mas não vejo nenhum bom motivo para ser vendida a estrangeiros. Por isso, a gestão por quem já conhece o sistema de saúde português parece-me preferível.

Paulo Mendo, antigo ministro da Saúde

[1] Há mais de vinte anos que defendo o fim do orçamento da saúde incluído no Orçamento do Estado e um acordo político que torne autónomo o financiamento da Saúde, como se decidiu e bem para a Segurança Social. Por isso o meu total acordo sobre a proposta do ministro.

[2] Só o melhora. Privado e público devem concorrer e colaborar em relacionamento sério, rigoroso e controlado. A excelência de um depende, também, da excelência do outro, em ambiente de mútua exigência.

António Ferreira, presidente do Conselho de Administração do Hospital de S. João

[1] Concordo. Sem consenso político não é possível, atendendo à amplitude de alterações a efetuar no sistema de saúde para o manter sustentável, prosseguir a reforma do mesmo.

[2] Não creio.

Purificação Tavares, médica geneticista, CEO CGC Genetics

[1] O ministro da Saúde tem optado por manter o SNS financiado através de impostos, em vez de optar por outras formas de financiamento, como taxas moderadoras ou outras.

[2] O mais importante é a manutenção da qualidade na prestação dos cuidados de saúde. Certamente a dinâmica será diferente conforme se trate de um grupo nacional já existente, onde haverá redundâncias, ou da entrada de um grupo estrangeiro.

Miguel Guimarães, Presidente da Conselho Regional Norte da Ordem dos Médicos

[1] Concordo. Se o acordo incluir o sentir da sociedade civil. Como património do país, o SNS deve ser objeto de um acordo transversal que preserve a sua essência humanista e solidária e assegure a indispensável qualidade que preserve a sustentação do futuro da nossa Saúde.

[2] Alterações vai produzir sempre. Independentemente da proposta vencedora, é importante que a operação seja transparente, respeite as regras de concorrência e assegure o mesmo nível de prestação da ES Saúde.

Isabel Vaz, presidente da Comissão Executiva da Espírito Santo Saúde

[1] Os recursos do país não são inesgotáveis. É preciso fazer opções sobre modelos de financiamento macro do sistema e de funcionamento, nomeadamente na prestação de cuidados - por exemplo, a reorganização da rede para fazer face aos desafios da cronicidade da doença e do envelhecimento da população e a articulação com os setores privado e social. Um acordo político de fundo sobre o SNS não é apenas um acordo para aumentar as receitas.

[2] Por razões que são públicas, não posso responder.

Redação