2005

"Carreira é como sacerdócio"

Elisabete Matos actuou pela primeira vez em Braga Cantora lírica portuguesa, radicada em Madrid, aponta falta de vontade política para criar espaços onde se possa ter um acesso mais fácil à cultura musical

Apesar de ter iniciado os estudos de canto em Braga, Elisabete Matos apresentou-se, na semana passada, pela primeira vez, na capital minhota, antes de mais um concerto em Pizza, Itália. A 15 de Abril, actua na inauguração da Casa da Música, no Porto, e foi sobre a falta de espaços culturais e de erros da política cultural portuguesa que impedem o salto qualitativo que trocámos impressões.

"Ser cantora lírica não é uma carreira comum. Implica ir para o estrangeiro, não só a nível académico como de carreira, porque temos um só teatro de ópera. É importante que Braga, Guimarães, Porto comecem a construir auditórios e salas de concerto, para que as pessoas tenham acesso à cultura", começa por argumentar Elisabete Matos, alegando que o desenvolvimento registado a outros níveis deve encontrar paralelismo na vida cultural.

Das bases da formação musical da família (na banda das Taipas) parte Elisabete para a defesa de uma revolução cultural, que passa pela proliferação de salas, pela massificação do ensino musical nas escolas básicas, pela política de mecenato que mantenha a autonomia da indústria.

"Em Espanha, qualquer pequena cidade tem um teatro. Aqui tem de se ir ao S. Carlos e mesmo esse perdeu a importância que tinha, pois acolhia as digressões europeias dos principais cantores. É preciso educar as pessoas para que gostem e criar espaços para que possam usufruir", argumenta.

Na leitura da realidade, Elisabete é pragmática "Não estamos a ter políticos capazes. Alguém tem de fazer alguma coisa, porque se me dedico a isto por gosto, os políticos têm de dedicar-se por gosto e não pode ser apenas por carreira". Em moldes mais concretos, Elisabete destaca as acções que os espanhóis dedicam às crianças, "com a ópera para niños", onde os temas infantis, as alegorias servem de iniciação.

Contra a velha prática lusa que valoriza o que vem de fora, a soprano aponta o "sacrifício" como palavra-chave na sua carreira e destaca o "estado permanente de hipersensibilidade", ao qual soma o estudo permanente e o gozo de incursões na audição de jazz e música brasileira.

"A música interessa-me a nível geral", diz, enquanto elege Mozart - "o compositor que sempre amei"- Puccini, Verdi, Wagner e Strauss, tidos como fundamentais na carreira "como cantora, mas como ouvinte também".

"Ser cantora lírica implica ir para o estrangeiro, tanto a nível académico como de carreira"

Radicada em Madrid desde os 18 anos

Natural de Caldas das Taipas, Guimarães, a soprano Elisabete Matos estudou canto e violino no antigo conservatório de Braga. Como bolseira da Fundação Calouste Gulbenkian, frequentou, desde os 18 anos, a Escola Superior de Canto de Madrid. Actualmente, trabalha com Angeles Chamorro e com a pianista Enza Ferrari. Já actuou nos principais palcos operáticos do Mundo.

Pedro Vila-Chã