Pedro Ivo Carvalho

O campeonato dos cobradores

O debate emocionado a que temos assistido por estes dias entre soldados e generais do anterior e do atual Governo, enquanto ecoam em fundo os sons graves da balada orçamental, apenas vem confirmar a estafada tese de que, por vezes, há que mudar tudo para ficar tudo na mesma. Porque o futuro do país tem tempo. E é muito mais relevante descobrir quem é, afinal, o menos mau de entre os nossos queridos líderes quando chega o momento de nos cobrir de impostos. Estratégia de desenvolvimento? Diminuir a despesa pública? Ah?

De nada nos vale saber, no âmbito da aprovação do Orçamento do Estado de 2016, quem levou a miúda para casa no final da noite: se foi o Governo, se foi a Comissão Europeia. As regras comunitárias são um espartilho tão apertado que é difícil, para não dizer impossível, escapar à sua força constritora. Por isso, a ideia da "resistência" à tecnocracia de Bruxelas é tão mais verdadeira quão mais eficaz for a capacidade de a comunicar. Os orçamentos são cada vez mais armas políticas e ideológicas. E o deste ano prova-o. Basta ver como, para os mesmos números, Direita e Esquerda tiraram conclusões distintas.

Mas o que verdadeiramente me faz confusão é esta espécie de Porto-Benfica fiscal. Quem foi mais amigo (força de expressão) dos portugueses? Passos, com o seu colossal aumento de impostos? Ou Costa, com o seu brutal aumento de impostos mascarados de austeridade benigna? Passos taxou os rendimentos, Costa taxou o consumo. Ambos atingiram o mesmo alvo usando armas diferentes.

Saber para onde vamos, descortinar, no meio desta verborreia de soundbites, o sentido da política de crescimento económico do país, não parece ser prioritário. Como, infelizmente, volta a não ser prioridade dos nossos queridos líderes avançar com a já anedótica reforma do Estado, esse mastodonte que continua a arrastar-nos para o fundo. Veja-se como o Orçamento de 2016 vai aumentar as chamadas gorduras públicas em 8,6% (+912 milhões de euros), somando um total astronómico de 11,5 mil milhões de euros de encargos estatais. Isto depois de nos terem vendido cortes, fusões, extinções e resmas de demissões. Já andamos pelo menos há seis anos a ouvir falar em "racionalização", "otimização" e "controlo de custos" para "combater os desperdícios".

Veem alguém preocupado? Para quê? Enquanto os governos tiverem o Estado na mão têm o poder na mão. É mais fácil jogar ao campeonato dos cobradores de impostos. Não há árbitro e o público não tem outro remédio senão comprar bilhete.

PEDRO IVO CARVALHO, EDITOR-EXECUTIVO-ADJUNTO