Faz hoje 17 anos, Lisboa acordou sobressaltada, ao som de sirenes de carros de bombeiros. O Chiado estava a arder. Prédios inteiros foram engolidos pelas chamas, que andaram durante horas "à rédea solta" pelas ruas do Carmo, Garrett, Nova do Almada, Ivens e Crucifixo, apanhando também a Rua do Ouro, Calçada do Sacramento e outras artérias da Baixa. O incêndio destruiu 18 prédios, fez dois mortos, 73 feridos, deixou entre 200 a 300 pessoas desalojadas e atirou para o desemprego cerca de dois mil trabalhadores. A pior tragédia que assolou a cidade desde o terramoto de 1755 deixou para sempre marcas no coração da urbe. Ainda hoje, há prédios por recuperar.
O alerta para os bombeiros foi dado pelas 5.19 horas. Segundo o relato dos jornais da altura - o JN dedicou seis páginas ao sucedido -, o fogo começou no rés-do-chão dos Armazéns Grandela, do lado da Rua do Ouro. Mas rapidamente chegou à cobertura do edifício, passou para a Rua do Carmo e espalhou-se pelos prédios vizinhos, galgando as ruas do quarteirão. No total, destruiu uma área de cerca de 7500 metros quadrados e provocou prejuízos na ordem dos "milhões de contos".
O vento, o rebentamento de botijas de gás, as dificuldades no acesso das viaturas de combate e a falta de água com que os bombeiros se confrontaram ajudaram à propagação das chamas, que destruíram também os famosos Armazéns do Chiado, Jerónimo Martins, Eduardo Martins e outras pequenas lojas e escritórios.
Os primeiros bombeiros a chegar ao local foram os Sapadores de Lisboa, que rapidamente se aperceberam da gravidade da situação e pediram reforços. Ao Chiado, acorreram corporações de todo o distrito - só de fora da cidade eram mais de 600 bombeiros -, e os auto-tanques do Aeroporto de Lisboa. Segundo o gabinete de crise, criado no próprio dia do incêndio, no combate estiveram 1150 homens e 275 viaturas.
As duas vítimas mortais foram um homem de 70 anos, encontrado morto nos escombros de um edifício, e um bombeiro de 31 anos que acabaria por falecer, a 2 de Setembro, no Hospital de São José, por não resistir aos ferimentos. Cerca de 60 bombeiros ficaram feridos.
No teatro de operações, além de milhares de pessoas que acorreram incrédulas com o que estava a suceder, estiveram as mais altas individualidades políticas do país. O presidente da República, Mário Soares, que chegou ao local logo da manhã, exclamou "Meu Deus, que tragédia!". O primeiro-ministro, Cavaco Silva, de férias no Algarve, chegou pelo meio-dia, e prometeu que seriam tomadas medidas imediatas "para que ninguém fique sem casa".
O assunto dominou a reunião do Conselho de Ministros desse dia. Ficou garantido que haveria um subsídio extraordinário para acudir ao desemprego forçado e criada uma linha de crédito para a reconstrução. Hoje há ainda prédios, como o "Edifício Leonel", em recuperação.