Os Panama Papers podem servir para que o jornalismo e os jornalistas possam a voltar a ser heróis. Mas também podem arruinar de vez a sua reputação. A questão é simples. Se o resultado do trabalho que fizerem com os papéis no Panamá for bom, a credibilidade dos jornalistas pode voltar aos tempos do Watergate; se for má, voltaremos a ter o jornalismo arrastado na lama da segunda invasão do Iraque.
O jornalismo perdeu muita da sua credibilidade quando, em 2001, embarcou incondicionalmente na estratégia internacional para derrubar Saddam Hussein onde jornalistas em todo o Mundo aceitaram, sem investigar, que havia armas de destruição massiva no Iraque e que o ditador era um dos apoiantes da organização terrorista Al-Qaeda. A Comunicação Social portuguesa também não foi exceção e fez alegremente parte da classe dos "bons alunos" escrevendo notícias verdadeiras sobre os factos falsos que lhe foram servidos em bandeja pela coligação internacional e que ninguém teve o cuidado de verificar.
Não podemos esquecer que Portugal teve na altura um papel central neste embuste. Foi o então primeiro-ministro, José Manuel Durão Barroso (depois dez anos presidente da Comissão Europeia), que acolheu nos Açores, na Base das Lages, o pontapé de saída para a guerra. Nessa cimeira, foi comunicado oficialmente ao Mundo o que pelo menos o presidente americano já sabia ser mentira: que as armas de destruição massiva nunca existiram. Quatro dias depois dessa encenação, a 20 de março de 2003, teve início da intervenção militar no Iraque. Todos foram enganados.
Os papéis do Panamá oferecem agora uma oportunidade de redenção aos jornalistas e ao jornalismo. Mas estão também repletos de perigos. A gigantesca quantidade de informação neles contida pode ser tratada de duas maneiras. Ou de uma forma séria, competente e profissional, permitindo que todos os factos lá encontrados sejam objeto de contraditório tendo a preocupação de não difamar ninguém; ou então, de uma forma sensacionalista, tendo como objetivo aumentar as audiências, o que inevitavelmente resultará num mau serviço público contribuindo para ampliar a confusão. Se assim for, e neste caso já aconteceu, os jornalistas voltarão a ser, desta vez de forma consciente, aliados de quem não quer esclarecer a verdade nem punir os responsáveis. Dá que pensar.