Já todos tínhamos percebido que não haveria deslocalização do Infarmed de Lisboa para o Porto. Com um estudo técnico nas mãos há três meses, o Governo tinha todos os elementos para tomar uma decisão - que, de resto, dizia estar tomada quando fez o anúncio inicial da medida, em novembro do ano passado. Se foi deixando o tempo passar, era fácil fazer a leitura de tamanha hesitação.
Não vale a pena discutir as vantagens e desvantagens da mudança. As conclusões estão plasmadas no relatório, que é público. Nem adianta falar sobre o consenso generalizado de que os serviços públicos desempenharão um papel essencial em qualquer modelo sério de descentralização. Já todos sabemos isso, Governo incluído. Mas saber é uma coisa, mexer numa cultura instalada é outra. E se o Porto, a segunda cidade do país, é encarado como o desterro, o que dizer do resto do território e da possibilidade de alguma vez se equacionar transferir serviços para o interior?
Que tudo fique na mesma, não surpreende. Mas fica, ainda assim, uma lição a tirar da atitude do ministro da Saúde no Parlamento. Adalberto Campos Fernandes tentou fingir que não havia decisão. E quase o conseguia, dado o desinteresse de grande parte dos deputados pela matéria. Só depois de quase duas horas de audição, tendo já repetido a frase estudada a remeter o dossiê para a comissão que irá acompanhar a descentralização no Parlamento, foi obrigado a explicar o que tinha decidido, continuando a fingir que não.
O ministro da Saúde foi à Assembleia da República empenhado em não anunciar que entendera haver "linhas vermelhas" que impediam a transferência. Sem a decência de falar com todas as letras à cidade a quem anunciou como dado adquirido algo que, afinal, não foi capaz de cumprir. Nem ele nem António Costa, que deu a cara pela mudança. A falta de coragem política fica-lhes mal.
*SUBDIRETORA