Da amizade entre três amigos e da paixão em comum pela literatura comprometida só com a realidade nasceu a editora 7 Nós. Alberto Pimenta e Joseph Beuys são os primeiros autores de um catálogo ainda restrito, mas apostado em marcar a diferença.
Não se revêem nas regras de uma área que vêem como "cada vez mais mercantil" e avessa à difusão da cultura. Em lugar de palavras em voga como "mercadoria", "rentabilidade" e "guilhotina", contrapõem com o gosto de editar livros que não esgotem o ciclo de vida ao fim de um punhado de meses.
"Não publicamos autores consensuais, mas também esta editora não nasceu para espalhar a concórdia. Recusa, sim, o consenso que está tão na moda e que, na realidade, não passa de uma censura encapotada", sintetiza Júlio do Carmo Gomes, que, a par de Óscar Sá e Manuel Tavares Teles, dirige a 7 Nós, projecto ligado à livraria Gato Vadio, situada também no Porto. Além de disponibilizar títulos de editoras de pendor alternativo, como a Fenda & Etc, Edições Mortas e Antígona, o espaço, na Rua do Rosário, funciona ainda como bar e dinamiza uma programação cultural própria que inclui debates, leituras e ciclos de cinema.
(Re)descobrir Alberto Pimenta
Mesmo sem experiência no meio editorial, o trio de responsáveis não teme os desafios que vai enfrentar num futuro próximo. A concentração crescente do sector e o número assustador de falências são, segundo os mentores da nova editora, sintomas da necessidade de mudança de uma área que deverá reencontrar a sua essência, perdida em nome de critérios economicistas em tudo contrários à literatura propriamente dita.
Os dois títulos inaugurais da 7 Nós - "Cada homem um artista", de Joseph Beuys, e "Que lareiras na floresta", de Alberto Pimenta - chegaram ao mercado há poucas semanas e pretendem reflectir a linha de pensamento do projecto. As relações de amizade com Pimenta facilitaram a obtenção do acordo, que prevê a reedição dos primeiros quatro livros do autor de "O silêncio dos poetas", publicados em regime de edição de autor entre 1970 e 1977. Até final do ano, chegam às livrarias "O labirintodonte", "Os entes e os contraentes", "Corpos estranhos" e "A ascensão de dez gostos à boca".
Poeta, performer, ensaísta e criador de "hapennings", Alberto Pimenta é, de acordo com Júlio do Carmo Gomes, "um exemplo claro de consistência", ao "colocar em causa os valores e a mentalidade da cultura portuguesa".
A reedição destes quatro títulos de poesia, a ser concretizada nos meses de Setembro e Outubro, assume particular importância não só porque "são fundamentais no caminho que o autor viria a traçar", como também devido ao facto de "Pimenta ser um autor cujos livros nunca se repetem".
Beuys, da teoria à prática
Ao publicar "Cada homem um artista", a 7 Nós conseguiu ser a primeira editora a assegurar os direitos para Portugal de um livro de Joseph Beuys, um dos mais influentes artistas plásticos e teóricos da segunda metade do século XX.
O interesse do público tem justificado o acerto da aposta. Em pouco mais de 15 dias, 500 dos 750 exemplares disponíveis já foram vendidos e a 7 Nós não tenciona fazer uma reedição.
Para Júlio do Carmo Gomes, esta é a prova de que a qualidade e o critério editorial são recompensados pelos leitores. O interesse pessoal do editor por Beuys remonta há vários anos e ganhou alento com a sua defesa acirrrada de valores como a autogestão e a democracia directa. "Não se limitou à produção de discursos. Ele levou à prática as ideias em que acreditava", reitera.
Gombrowicz, Bulgakov e Robert Louis Stevenson (ler caixa) são outros dos autores cimeiros com publicação assegurada.