Uma menina de 11 anos pediu ajuda ao pai para se inscrever no Facebook. O pai, por sua vez, recorreu ao fundador do site Miúdos Seguros na Net para saber se a idade era adequada e o que devia fazer. Segundo a rede social, seria preciso ter 13 anos para ter conta.
Tito Morais, residente do Porto, aconselhou João Traca, advogado de Lisboa, a ser o próprio a ensinar a filha a dar os primeiros passos nas redes sociais. Não vale de nada contrariar-lhe a vontade. Fá-lo-ia às escondidas. Concordaram nestes pontos. João Traca consultou então as páginas recentemente lançadas por Tito de Morais (http://www.facebook.com /ParaPais) e, munido de uma lista de recomendações, foi dando instruções à filha. Para seu espanto, numa semana, a miúda reuniu 100 amigos. Agora tem mais de 120. Começou há 15 dias.
As normas do Facebook são claras. Inspirada numa lei federal norte-americana, segundo a qual só é possível utilizar dados dos que têm mais de 13 anos, a rede impõe este limite para o início da vida online. Havendo uma denúncia, o registo desaparece. A realidade aponta, porém, noutra direcção. De acordo com um estudo do EuroKidsOnline, mais de um terço de crianças estão activas numa rede social e Portugal alinha com a média europeia. As alterações que o Facebook começou a introduzir esta semana aumentam a exposição individual.
Em muitos casos, são os pais que mentem na idade dos filhos para lhes poderem abrir a página. O JN recorreu ao Facebook (FB) para chegar a quem o tenha feito, e não faltaram exemplos. Em 24 horas, surgiram cerca de 10 histórias. Destes adultos, apenas uma mãe se mostrou contra a entrada precoce nas redes sociais, embora a tomada de posição não traduza a ideia de que as crianças devam estar afastadas do contacto com o Facebook. "A minha filha vê-me a usar o FB todos os dias", diz Maria Inês Soares Ferreira, moradora em Viseu. "É através dele que falamos com os avós depois do jantar. Na nossa casa, veio substituir o telefone".
Tito Morais não diaboliza as redes sociais e encontra-lhes virtudes. Ao factor idade, sobrepõe a necessidade de regras de conduta. E aí entra a participação dos pais. "Trazem vantagens", refere. "Os pais podem ficar a saber com quem se dá o seu filho e deixam de precisar de o seguir em vários sites, está tudo ali concentrado". Trata-se de "uma excelente forma para acompanhar os filhos".
Tito Morais apresenta links de sites deste género mais adequados à estreia dos miúdos, todos eles a exigirem vigilância por parte dos adultos. GiantHello, Imbee, Togetherville, adquirida pela Disney, têm ganho subscritores.
No que respeita a legislação, a Comissão Europeia continua a propor auto-regulação e co-regulação junto das redes sociais, mas, a questão de base, defende Tito Morais, passa pela aposta na formação de professores e pais. Propõe que se tire partido do Facebook, se faça dele uma ferramenta interessante na comunicação entre docentes e famílias. E diz mesmo que é a "discoteca" de outros tempos, que era o espaço de convívio para a sua geração.
"Os pais não devem estar na discoteca, ninguém gosta de os ter atrelados, mas podem estar por perto, afastados da pista de dança". Um dos alertas a fazer junto dos mais novos refere-se ao poder de replicação da informação ali colocada - "Uma vez na internet, para sempre na internet". Outra dica a ter em conta é a falta de contexto real das redes sociais, com a consequente deturpação e equívocos gerados.
Clara Guerra, da Comissão Nacional de Protecção de Dados, defende igualmente a prevenção como o caminho a seguir. As acções desenvolvidas pelo organismo nas escolas seguem este propósito. "Desconfia", é um dos lemas. "A simples revisão do perfil ao lado das crianças pode minimizar riscos". A responsável diz que "os miúdos não gostam de ser enganados e, ao aperceberem-se disso, afastam-se". Quando alertados para os riscos - contactos com adultos desconhecidos, pedofilia -, eles ficam de olho aberto.
"Sobre a protecção de dados pessoais, não existe legislação própria para os mais pequenos", lembra. "Só para consentimento médico é que o Código Civil estipula a idade dos 14 anos". Cabe aos pais assumir a responsabilidade. Os mecanismo de auto-regulação têm sido reforçados, embora a maior parte das redes mantenha os dados em aberto, por defeito. "Porque não se lhes exige o contrário?" Clara Guerra defende a inclusão destas matérias nos programas escolares e deixa a ressalva. "As pessoas têm mais poder do que julgam, o consumidor é livre e pode sempre arredar pé e isso as empresas não querem. Portanto, protestem."