Reino Unido

"Acidente sexual que correu mal". Jovem bilionário confessa homicídio à BBC

Daniela Jogo

Martine Vik Magnussen tinha 23 anos quando foi assassinada|

 foto Facebook/Justice for Martine Vik Magnussen

Martine Vik Magnussen e Farouk conheceram-se na faculdade|

 foto Facebook/Justice for Martine Vik Magnussen

Farouk Abdulhak, filho de um bilionário do Iémen, fugiu de Inglaterra em 2008, horas depois de ter deixado o corpo violentado de Martine Vik Magnussen, de 23 anos, na cave do prédio onde vivia. Refugiou-se no país natal para escapar à Justiça britânica e até agora nunca tinha falado sobre o caso. Volvidos 15 anos da fatídica noite, confessou o seu envolvimento no caso, admitindo que foi "um acidente sexual que correu mal".

"Fiz algo quando era mais jovem, foi um erro...", revelou Farouk Abdulhak. "Não posso ir para o Reino Unido por causa de algo que aconteceu lá". Estas frases foram enviadas pelo principal suspeito da morte de Martine Vik Magnussen à jornalista da BBC Nawal Al-Maghafi ao longo de cinco meses de negociações para uma entrevista formal.

Farouk integra a lista das pessoas mais procuradas pela Polícia de Londres e é alvo de um mandado internacional de prisão, mas mantém-se como um homem livre no Iémen. Nunca explicou o que aconteceu na fatídica noite de 14 de março e só agora, 15 anos depois, é que confessou a sua participação na morte da estudante norueguesa, de 23 anos, por telefone. Revelou também que não tenciona voltar ao Reino Unido, porque não quer ser julgado por um "sistema judicial tendencioso". Sobre o crime? "Foi apenas um acidente. Nada nefasto. Só um acidente sexual que correu mal." Martine foi violada e depois estrangulada.

O crime e a fuga para o Iémen

Farouk e Martine estudavam na Regent's Business School, em Londres, e foi aí que se conheceram. No dia 14 de março foram celebrar o fim dos exames para a discoteca Maddox, em Mayfair, no centro da cidade.

Martine Vik Magnussen e Farouk conheceram-se na faculdade

Foto: Facebook/Justice for Martine Vik Magnussen

Na época, as amigas da estudante norueguesa contaram às autoridades que Farouk as convidou para o apartamento dele depois da festa, na Great Portland Street. Mas como estavam muito cansadas recusaram o convite, à exceção de Martine. As câmaras de segurança do estabelecimento mostraram a jovem a sair de braço dado com Farouk às 2.59 horas. Uma amiga da vítima revelou também que ela costumava ficar no apartamento de Farouk pela localização central.

Quando o sol nasceu, Martine já estava morta e o seu corpo só seria descoberto 48 horas depois. Nessa altura, Farouk já tinha deixado o Reino Unido em direção ao Cairo, no Egito. Lá, apanhou o jato particular do pai e voou para o Iémen - lugar onde nunca tinha vivido antes, mas de onde seria impossível extraditá-lo. Em 2008, o advogado de Farouk disse que ele era inocente e não tinha matado Martine.

Desde então, a família da jovem tem tentado levar o principal suspeito do assassinato ao banco dos réus, mas até agora sem sucesso, muito devido à cortina de proteção que envolve Farouk. Criado entre os Estados Unidos e o Egito, é filho de Shaher Abdulhak, um dos homens mais ricos e poderosos do Iémen. Shaher morreu em 2020 e era dono de um império de açúcar, refrigerantes, óleo e armas. E amigo próximo de Ali Abdullah Saleh, na altura presidente do Iémen.

Foi "só um acidente sexual que correu mal"

Desde 2011 que a jornalista da BBC Nawal Al-Maghafi procura entender o que aconteceu a Martine. Depois de um hiato sem quaisquer avanços, em 2022 conseguiu o número de Farouk Abdulhak, com quem partilha a naturalidade, e contactou-o.

Após longos meses de troca de mensagens e experiências, o homem, agora com 35 anos, confessou que tinha cometido um erro quando era mais novo. A jornalista conta no documentário da BBC "Assassinato em Mayfair" que o suspeito está isolado no Iémen e que isso pode justificar a decisão de falar e "abrir-se" pela primeira vez com uma jornalista. Toda a família vive fora do Iémen - incluindo a ex-mulher e filha, por causa da guerra civil do país. E ele não as visita por medo de ser preso. "Nenhum dos amigos de Farouk com quem falei durante a minha investigação ouviu falar dele desde que fugiu - embora todos tenham dito que ficaram chocados quando leram sobre a morte de Martine na época", revelou a jornalista.

Farouk admitiu não se lembrar bem daquela noite, "é tudo muito confuso". "Tenho flashbacks de vez em quando e se cheiro um certo perfume feminino, sinto-me desconfortável", confessou. Naquela noite, Farouk tinha consumido cocaína e responsabiliza a substância pela ausência de memória. Numa das muitas mensagens e chamadas trocadas com a jornalista garantiu que se tratou "apenas de um acidente, nada nefasto. Só um acidente sexual que correu mal".

Quando questionado se voltaria para o Reino Unido para enfrentar a Justiça, não se mostrou disponível a voltar. "Não acho que será feita Justiça (...) Acho que o sistema da justiça lá [no Reino Unido] é fortemente tendencioso. Eles vão querer fazer de mim um exemplo, sendo do filho de um árabe... de alguém rico... é tarde demais," reforçou.

A família da jovem norueguesa também participou no documentário e pediu ao suspeito para voltar. "Volte para o Reino Unido. Conte o que aconteceu com Martine. Não só a Martine merece isso, mas nós também", disse Odd Petter, à BBC.

"Estou otimista de que podemos ter uma solução a longo prazo... porque podemos falar com ele. Estou mais do que nunca convencido de que haverá uma solução para este caso. Só espero que seja nos nossos padrões éticos".

Há mais de 15 anos que o principal suspeito do crime está identificado, mas a polícia está impedida de fazer cumprir a Justiça por não haver um acordo de extradição entre o Reino Unido e o Iémen.

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