Primeira-ministra do Japão pode quebrar tradição que exclui mulheres de ringue "sagrado"

Primeira-ministra japonesa, de perfil conservador, pode mudar tradição antiga da modalidade de sumo
Foto: EPA
A 11 dias do fim do torneio nacional de sumo, tradicional modalidade japonesa, na cidade de Fukuoka, reacende-se o debate sobre um costume que considera as mulheres "impuras". Embora seja tradição os prémios serem entregues pelo chefe de Governo no dohyo, o círculo onde ocorrem os combates, as mulheres estão historicamente proibidas de lá entrar por motivos religiosos.
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A competição de Fukuoka marca a grande final de um ciclo anual de seis torneios. No fim, o vencedor recebe o troféu do primeiro-ministro das mãos do próprio, que sobe ao dohyo para a entrega. Este papel está tradicionalmentereservado aos homens, uma vez que, de acordo com crenças xintoístas, religião nativa do Japão, as mulheres não devem entrar nem tocar no espaço "sagrado" do dohyo, por estarem associadas à impureza do sangue menstrual.
Questionado sobre se a atual primeira-ministra do país, Sanae Takaichi, eleita no mês passado, pretende obter permissão para entregar pessoalmente o troféu de ao vencedor do torneio, o secretário-chefe do gabinete evitou uma resposta direta.
"A primeira-ministra deseja respeitar a tradição e a cultura do sumo. O Governo ainda não tomou uma decisão sobre o assunto. Analisaremos uma resposta adequada com base na vontade da primeira-ministra", disse Minoru Kihara aos repórteres esta semana, de acordo com a agência de notícias Jiji Press, citada pelo "The Guardian".
A menção à tradição sugere que Takaichi, a primeira primeira-ministra da História do país, de perfil conservador, pode optar por não confrontar abertamente a proibição. No sumo profissional, as mulheres continuam proibidas de subir ao dohyo, embora possam competir e arbitrar nas modalidades amadoras.

Tradição e controvérsia
O debate sobre a exclusão feminina da modalidade ganhou destaque em 1990, quando Mayumi Moriyama, primeira mulher a ocupar o cargo de secretária-chefe do Executivo japonês, expressou o desejo de entregar o troféu. O pedido foi negado.
Dez anos depois, a então governadora de Osaka, Fuse Ohta, foi obrigada a entregar o prémio ao campeão do torneio local a partir de uma passarela lateral, já que os seus repetidos pedidos para entrar no ringue tinham sido rejeitados.
Em 2018, o tema voltou a causar indignação durante um torneio em Maizuru, perto de Quioto, quando o autarca local, Ryozo Tatami, desmaiou enquanto discursava no centro do dohyo.
Várias mulheres, entre elas uma enfermeira, correram para prestar socorro. Mesmo diante da emergência, o árbitro pediu repetidamente que elas deixassem o ringue. Após o sucedido, sal foi espalhado sobre a arena num ritual de "purificação", gesto que os responsáveis pelo torneio negaram ter relação com a presença das mulheres.
A reação pública foi alarmante. O então presidente da associação pediu desculpa pelas "ações inapropriadas" do árbitro. Pouco depois, novos protestos surgiram quando Tomoko Nakagawa, autarca de Takarazuka, foi impedida de discursar no centro do dohyo durante um evento. Forçada a falar da lateral, declarou sentir-se "mortificada", sendo aplaudida pelo público.
Em 2019, a associação anunciou a criação de um painel de especialistas externos para rever a proibição, mas até hoje não chegou a uma conclusão, informou o jornal "Asahi Shimbun" neste mês.
