Escândalo com gravações do candidato republicano, Donald Trump, dá um duro golpe no partido.
Ainda sem se saber o resultado do debate das presidenciais norte-americanas deste domingo à noite (madrugada de segunda-feira em Portugal), em Saint Louis, no Arizona, uma coisa parecia começar a desenhar-se com traço firme: o candidato dos republicanos às eleições de 8 de novembro marcou uma viragem na campanha. E um duro golpe no partido, publicamente corado de vergonha.
Donald Trump marcou essa viragem não só com a revelação clara da personalidade que encerra, numa gravação antiga em que se gaba grosseira e abjetamente de apalpar as mulheres que quer, mas sobretudo com a reação que teve, um pedido de desculpas acompanhado de um aviso à adversária, a democrata Hillary Clinton.
O marido dela, disse Trump, "abusou de mulheres". E ela "intimidou"-as e "perseguiu"-as. Sábado à noite, Trump retuitou publicações de uma conta sob o nome de Juanita Broaddrick, alegada vítima de violação por Bill Clinton em 1978. As mensagens classificam o marido de Hillary de violador. Mas, garante Trump, hoje é um homem diferente.
Para lá das dezenas de republicanos, entre os quais Condoleezza Rice, secretária de Estado do Presidente George W. Bush, que lhe viraram publicamente as costas e pediram a desistência da corrida - não, disse ele, porque nunca desistiu "na vida". E porque, dizem outros, até democratas, é demasiado tarde para alterações numa eleição que já começou por correspondência, ainda que sejam tecnicamente possíveis -, a própria senhora Trump aludiu a palavras "inaceitáveis" (ainda que diga que não representam o homem que Melania conhece e peça ao mundo que aceite o alegado pedido de desculpa).
"Provavelmente não deveria atacar uma esposa pelos casos do marido se quer mesmo recuperar meia dúzia de votos femininos. Mesmo que essa esposa seja a sua concorrente", escreveu no jornal britânico "The Guardian" o colunista Richard Wolffe, um analista político que já passou por algumas das maiores publicações norte-americanas. "Percebem-no quando o veem, aquele momento em que uma eleição vira decisivamente. Não é um alerta, não uma gafe, não são apenas uns dias maus. É antes o ponto de não retorno para os candidatos e para os eleitores indecisos".
O colunista recorda dias idênticos em eleições anteriores, como aquele de 2008 em que John Mc Cain suspendeu a campanha para adiar o debate com Barack Obama por alegadamente pretender dedicar-se à crise financeira que estalava, fresca. Ou aquele de 2012 em que um vídeo mostrou Mitt Romney a desdenhar dos eleitores de Obama. Acrescente-se aqui, a propósito, que ambos os ex-candidatos republicanos avisaram anteontem que não votariam Trump...
Wolffe resume Donald Trump: "um homem que já não serve como companhia educada (..). O rol de deploráveis acabam de encontrar o seu Mr. Universo. Ele confirmou que desdenha das mulheres e muitas eleitoras vão seguramente devolver-lhe a gentileza". Ora, elas são a maioria dos eleitores nos últimos 40 anos e, entre os eleitores brancos elas estão claramente do lado de Clinton, enquanto entre os negros e hispânicos a xenofobia de Trump tem sido muito clara ao longo da campanha. Ainda assim, não faltaram apoios, a começar pelo do Rudy Giuliani, o ex-mayor de Nova Iorque que encantou o mundo no pós-11 de setembro.
Uma viragem. Ou talvez não, recordava o jornal norte-americano "The Washington Post": as médias das últimas sondagens, publicadas domingo, revelam que "a corrida eleitoral já era uma enorme montanha para Trump trepar, ainda antes da revelação da gravação de 2005, na sexta-feira".