Rafael BarbosaA maioria absoluta está morta?"O que queremos é uma maioria absoluta que não esteja morta". A frase é do presidente da República. Foi dita no rescaldo de uma entrevista, neste arranque de semana, em que António Costa se escudou na maioria absoluta, conseguida em janeiro do ano passado, para jurar que será primeiro-ministro até 2026. Se um cidadão português vindo de Marte aterrasse neste instante nas notícias sobre a atualidade política e fizesse uma interpretação literal das palavras de Marcelo Rebelo de Sousa, a conclusão seria mais ou menos imediata, óbvia e brutal: o Governo tem os dias contados.
Rafael BarbosaNão há greves fofinhasNão há greves fofinhas. Se há um impasse negocial e os trabalhadores decretam uma greve, o objetivo é causar dano e forçar o patrão a negociar. No Estado ou nas empresas privadas. É assim também com as greves dos professores. Reconhecer essa legitimidade não invalida, no entanto, que se questionem alguns dos métodos que estão a ser utilizados.
Rafael BarbosaOs estilhaços da crise1. Depois de duas semanas alucinantes, a crise no Governo parece terminada. Para o bem e para o mal, António Costa tem mandato para governar. E tem uma maioria absoluta. O que não quer dizer controlo absoluto. Se há facto que se destaca nesta crise é o da nova centralidade política de Marcelo Rebelo de Sousa. O presidente não é apenas um personagem popular. É alguém cuja palavra permite manter ou derrubar ministros e secretários de Estado. E que deixou um aviso político sério: se o Governo não for capaz de gastar, este ano, os 15 mil milhões de fundos europeus disponíveis, não terá futuro. A bomba atómica (dissolução do Parlamento e eleições antecipadas) está à mão.
Rafael BarbosaAntónio Costa nas trincheirasContinuidade e estabilidade. Foram as palavras-chave do primeiro-ministro para justificar as suas escolhas para as pastas das Infraestruturas e da Habitação. Preferiu gente já tarimbada na resolução de problemas, num período em que, como ele próprio disse, há muitos milhares de milhões de euros para gastar com toda a rapidez. Seja na ferrovia, que atribuiu a João Galamba, seja na habitação, que fica para Marina Gonçalves.
Rafael BarbosaOu há ética ou há bananasA TAP não é uma empresa qualquer. É uma empresa do Estado. E foi por ser uma empresa pública, e por estar tecnicamente falida, devido aos efeitos da pandemia, que recebeu 3200 milhões de euros. Dinheiro que saiu do bolso dos contribuintes portugueses. Todos ajudámos a pagar a sobrevivência da TAP.
Rafael BarbosaDepois da tempestade vem a bonançaNão é segredo para ninguém, menos ainda para os decisores políticos. Nas nossas cidades, em vez de ordenamento, temos desordenamento do território. A impermeabilização dos solos é a regra, seja pelo cimento das construções, pelo alcatrão das ruas ou pelo encanamento das linhas de águas que, mais cedo do que tarde, saem dos eixos, destruindo tudo. A ocupação dos leitos de cheia é a regra e não a exceção, porque foi assim que fomos ocupando o território e porque não há melhor promoção para um novo investimento imobiliário do que anunciar a vista rio ou a vista mar. E nada disto vai mudar, porque custaria muitos milhões realojar famílias e negócios. E, finalmente, temos as alterações climáticas, como fica de novo provado por esta alternância esquizofrénica em que, de uma estação para a outra, passamos da seca extrema para o dilúvio.
Rafael BarbosaUm referendo esdrúxulo1. Já o escrevi neste mesmo espaço, a propósito da discussão sobre a eutanásia. Mas vale a pena voltar a escrevê-lo, porque, mesmo que seja óbvio para a maioria, haverá ainda quem não tenha percebido: o que está em causa não é matar, é morrer.
Rafael BarbosaAgora sim, uma geringonça?É um estranho Governo, este. Não tem ainda nove meses de gestação e somam-se os problemas, incluindo várias idas à urgência. Uma situação surpreendente, se se valorizar o facto de estar suportado na maioria absoluta de um só partido, o que, teoricamente, lhe deveria garantir maior consistência. Os ministros e secretários de Estado só teriam de dialogar uns com os outros, sem necessidade de articulação com outros partidos e menor risco de gerar cacofonia. Mas sucede exatamente o contrário.
Rafael BarbosaNegociar com um terrorista?Houve um tempo em que Putin e os seus sequazes julgaram que seria possível ocupar a Ucrânia e derrubar o seu Governo legítimo em três dias. A previsão falhou, porque o exército russo tinha pés de barro, minado pela incompetência e a corrupção do regime.
Rafael BarbosaVem mais gente e fome a caminho1. No ano em que nasci, 1968, havia 3500 milhões de habitantes na Terra. Em meio século de vida, vieram fazer-me concorrência pelos recursos do planeta mais do dobro, ou seja, 7200 milhões de pessoas.
Rafael BarbosaUm ativo tóxicoO antigo presidente da Câmara Municipal de Caminha decidiu fazer um negócio com dinheiros públicos cujo racional não se alcança: pagou 300 mil euros adiantados em rendas a um promotor que se propôs construir um centro de exposições transfronteiriço, num investimento que totalizaria oito milhões de euros. Acresce que o promotor não tinha sequer o currículo que dizia ter. Ou seja, nunca fez nada de semelhante ao que se propõe fazer em Caminha. E assim, sem surpresa, dois anos depois do pagamento com dinheiros públicos, não há sinal de obra.
Rafael BarbosaOs caudilhos americanos1. O Brasil libertou-se, até ver, de um caudilho. Na presidência de um dos mais importantes países do Mundo deixará de estar um misógino, um racista, um homofóbico, um corrupto. Um extremista de Direita (muito aplaudido pelos que temos por cá) que despreza os direitos humanos e a democracia. Com o trabalho dos seus apóstolos nas redes sociais somado ao dos pastores evangélicos nos templos, converteu quase metade da população ao seu sonho distópico. A sua derrota justifica festejos, mas sem euforia. Desde logo, porque o novo presidente também carrega sobre os ombros a suspeita da corrupção. Lula só em parte foi absolvido, a maioria dos processos ou foram suspensos ou prescreveram. Foi o suficiente para travar Bolsonaro, mas, para além da fragilidade pessoal (milhões de brasileiros mais não fizeram do que escolher o que consideram ser o mal menor), a base de apoio político-partidária de Lula é pouco sólida. A luta pela recuperação de uma democracia funcional está no início. E os seus inimigos continuam à espreita. No Sul e no Norte do continente.
Rafael BarbosaA guerra com a China já começou1. Numa Europa pressionada pela guerra na Ucrânia e pelos seus efeitos nos preços da energia e no custo das nossas vidas, passou quase despercebido que uma parte da última Cimeira Europeia foi dedicada à ameaça chinesa.
Rafael BarbosaEstão a matar meninas iranianas1. Sarina, Nika e Asra tinham em comum a idade: 16 anos. E o facto de participarem nos protestos que varrem o Irão desde a morte de Mahsa Amini (por causa de um hijabe mal colocado e demasiado cabelo à vista). E todas pagaram com a vida a ousadia de sonhar com alguma liberdade. Sarina gostava de publicar vídeos em que aparecia a cantar, a dançar, a cozinhar, a maquilhar-se, a falar de amor. Saiu de casa para protestar e foi morta. Nika também saiu para desafiar os aiatolas. Circula pelas redes o vídeo em que queimou o seu hijabe em público. Pagou com a vida. Asra estava na escola quando esta foi invadida pelos carniceiros do regime. Tentaram forçá-la a entoar uma canção de louvor ao líder supremo, Ali Khamenei. Recusou, foi espancada, morreu.
Rafael BarbosaOrçamento assim-assimNão é bom, nem é mau, é assim-assim. O Governo apresentou um Orçamento do Estado em que dá um bocadinho a quase todos. Seja aos cidadãos, seja às empresas. Seria suficiente se a crise acabasse já para a semana. O problema é que a crise não vai acabar para a semana e o diminutivo "inho" ameaça devorar o bocado que ainda possa sobrar nos orçamentos das famílias e das empresas.
Rafael BarbosaO "centrão" ganha sempre1. Para quem ache que o quadro partidário em Portugal é fragmentado (oito partidos), compare-se com o Brasil: há 23 partidos representados na Câmara dos Deputados. Uma navegação impossível, mesmo para o mais informado dos cidadãos. Se tivermos em conta os partidos mais à Esquerda e próximos de Lula (incluindo o PT), somam agora pouco mais de 100 deputados (de um total de 513). O bloco de Direita mais próximo de Bolsonaro tem cerca de 200. Quer isto dizer que Bolsonaro terá mais facilidade do que Lula na hora de negociar acordos no Congresso que permitam governar? Não, porque quem manda é o "centrão".
Rafael BarbosaNão é fascismo mas é perigosoCalma, o fascismo não está de regresso a Itália. Giorgia Meloni não é Benito Mussolini; os Irmãos de Itália não são os camisas-negras que marcharam sobre Roma; o ecossistema político, social e económico dos anos 20 do século XXI tem muito pouco que ver com os anos 20 do século XX e, finalmente, a Itália tem uma Constituição marcadamente antifascista (desde 1948) que os "irmãos" populistas de extrema-direita não conseguirão alterar, nem mesmo com a ajuda dos "primos" Salvini e Berlusconi.
Rafael BarbosaO que vem aí é... pior"O que vem aí é mau", disse, há dias, o presidente da República. Um alerta oportuno, quando a inflação empobrece tanta gente e no horizonte se desenha uma recessão, com a consequente destruição de emprego e de vidas. Mas, na verdade, o alerta de Marcelo Rebelo de Sousa peca por defeito. Esquece que o que temos já é mau. E que, portanto, o que vem aí é pior. Usar o grau comparativo de superioridade só parecerá excessivo a quem não tenha reparado que foi publicado, há poucos dias, o último relatório do Eurostat sobre o risco de pobreza e exclusão social.
Rafael BarbosaNem médicos, nem professoresVem aí mais um desafio para o Governo e para as contas públicas: a negociação dos aumentos salariais na Função Pública. O primeiro-ministro aponta a um aumento de 2%, apesar de reconhecer que a inflação será de 7,4%.
Rafael BarbosaPôr o capitalismo entre parêntesis1. É quase inútil a discussão sobre se o Governo foi generoso ou ardiloso nas medidas de combate à inflação. Se podia ter ido mais longe ou se ficou demasiado distante. Se seria melhor baixar impostos em vez de atribuir subsídios. Na verdade, é possível encontrar argumentos válidos entre os que apoiam e os que rejeitam as opções de António Costa. Mas vale a pena alertar para o excessivo tribalismo partidário com que socialistas, por um lado, e as várias oposições, por outro, conduzem a discussão pública. A maioria dos portugueses vive dias de aperto, seguramente apreciariam mais pragmatismo e menos dogmatismo.
Rafael BarbosaFalcões e pombas1. Mário Centeno, antigo ministro socialista das Finanças, agora governador do Banco de Portugal (com assento no Banco Central Europeu), deixou o aviso, perante as notícias de que o Estado poderá abrir mão de umas centenas de milhões de euros de receitas, dessa forma aliviando o garrote das famílias com as faturas da luz e do gás, da bomba de gasolina ou do supermercado: é preciso "paciência com a inflação", diz Centeno, assegurando que, no médio prazo, descerá para 2% (em agosto chegou aos 9%). Problema: as contas são para pagar agora, não no médio prazo. O Ronaldo das Finanças (dizem os alemães) também quer prudência nas medidas de apoio, rejeitando exuberâncias quando a economia cresce, o desemprego está em mínimos e os salários sobem 4%. Argumenta com dados macroeconómicos, que são verdadeiros. O problema é que as pessoas vivem na microeconomia. Por exemplo, os quase três milhões de trabalhadores por conta de outrem cujo salário é inferior a mil euros e que foi engolido pelo custo de vida. Centeno transformou-se num "falcão" da economia. Se é que alguma vez foi uma "pomba".
Rafael BarbosaTeatro de sombrasJá parece uma anedota distante. Mas foi há apenas um ano (final de agosto de 2021). O PS reunia-se em congresso e discutia-se a sucessão de António Costa. Quem seria o favorito dos militantes? Quem teria mais apoios no aparelho? Quem seria bafejado pelos favores do líder e ficaria sentado ao seu lado: Pedro Nuno Santos, Fernando Medina, Ana Catarina Mendes ou Mariana Vieira da Silva?
Rafael BarbosaAté ao verão seguinteO argumento de que os fogos são uma catástrofe natural que podemos combater, mas não evitar; que são o resultado do aquecimento global e que, por isso, nos afligem a nós como a todos os outros; que este ano está a ser um dos mais quentes e secos desde que há registos e, portanto, nada a fazer; que só através da ação concertada do Mundo poderemos travar esta troika de calor, fogo e seca - são argumentos verdadeiros, mas esgrimidos de forma falaciosa.
Rafael BarbosaSolidários com o povo ucraniano1. Foi há seis meses que a ambição e violência do regime nacionalista russo nos surpreendeu. Já morreram milhares de pessoas. Um sem-número de casas, escolas ou hospitais foram destruídos pelas bombas. Milhões de mulheres e crianças fugiram e espalharam-se pela Europa.
Rafael BarbosaO menino da sua mãeSabe-se que há um conflito entre mãe e pai desde que o menino tinha um ano (agora tem oito). Sabe-se que a mãe saiu de casa com o filho bebé, acusando o pai de comportamentos violentos, mas que nada foi provado e que as queixas foram arquivadas.