No último fim de semana do Ramadão, Sheikh David Munir foi o anfitrião de uma palestra-debate sobre a "Ética à luz do Islão". Apesar das mulheres se sentarem à esquerda e os homens à direita, os temas interessavam directamente a todos. A eutanásia, o suicídio e a contracepção estiveram em cima da mesa para serem discutidos por uma plateia com mais de duas centenas de pessoas.
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David Munir explicou que o Corão não tem necessariamente uma resposta para todas as dúvidas postas pelos crentes muçulmanos. Numa das intervenções, o imã de Lisboa contava que uma tribo que aceitou o Islão perguntou ao profeta Maomé se podiam continuar a praticar o coito interrompido. O profeta, explicou David Munir, respondeu simplesmente que podiam usar aquele método até porque "se for para nascer, nasce".
Já passava da meia-noite quando uma mulher quis discutir a postura dos muçulmanos perante a morte. A muçulmana perguntava porque razão não se poderiam manifestar perante a morte de um familiar, numa altura em que é difícil controlar os sentimentos. Contou que lhe disseram que as suas lágrimas enchiam um rio que impedia o falecido de atravessar o caminho da a seguir à morte.
David Munir foi rápido para explicar que "isso dos rios de lágrimas não existe e "são apenas imagens que se apontam para as mulheres não chorarem tanto". Deve-se, explicou, "evitar-se cenas, choros e gritos, mas chorar é permitido".
Relativamente ao álcool e aos jogos de azar, não havia dúvidas: o Islão proíbe. Mas no que toca ao planeamento familiar, o Islão não é contra. Já a eutanásia não é bem vista pelos ensinamentos muçulmanos. Deve-se, explicou o sheikh, "rezar-se o Corão por aquele que está a sofrer". Depois da morte, o livro sagrado diz para se pagar o funeral e depois as dívidas.
David Munir falava português, mas intercalava com pequenas expressões em árabe. Por exemplo quando referia o profeta, imediatamente murmurava "Sallallahu Aleihi Wassalam" - que a paz e as benção de Deus estejam com ele -, como aliás sempre o fazem todos os muçulmanos, quando, a meio de uma frase, mencionam o nome de uma das figuras mais importantes do Islão.
Ainda na discussão sobre morte, David Munir fez questão de dizer que a separação entre ciência e a religião é uma das piores medidas. O que implica, sustenta, que, "quando isso acontece, acaba por ser necessário convidar o cientista e o teólogo para que se chegue a uma conclusão". É o caso da doação de órgãos. Alguns muçulmanos não vêm com bons olhos aquela prática, mas David Munir declarou que "é a favor". E concluiu que "até há quem diga que a alma já não está lá, quando se morre cerebralmente".
Já perto das três da madrugada, entre algumas histórias para exemplificar as noções de ética, David Munir contou que "uma mãe disse ao Profeta que o filho comia muitos doces, se lhe podia chamar a atenção". Ele, que aceitou advertir o filho, também gostava de doces e, por isso, antes de falar com a criança não comeu açúcar durante três dias.
A terminar, o imã da Mesquita de Lisboa insistiu na ética do Islão onde deve caber a piedade, a tolerância, o respeito, a veracidade, a honestidade, a bondade e coragem no amor e guerra. E deixou um lamento final: "o mundo está como está porque perdeu a ética e os valores".