A realização fatídica chega ao seu auge quando um romeiro exige falar com Madalena. Depois de um diálogo sincopado, expectante, recheado de indícios, entre ela e o Romeiro, - Já não tenho família; hão-de jurar que me não conhecem; há três dias que não durmo ... porque jurei ... faz hoje um ano (...) - Madalena toma conhecimento de que o seu primeiro marido está vivo, embora julgando que se encontra longe. No entanto, D. João de Portugal tudo faz para que ela o reconheça naturalmente (arrependendo-se mais tarde e depois de assistir às consequências da sua chegada); contudo, somente Jorge faz esse reconhecimento (anagnórise) e dá a conhecer a verdade a seu irmão.
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A descrição em didascália do espaço do terceiro ato é um indício da tomada de hábito: (...) sua grande cruz negra (...) um castiçal (...) vela acesa (...) um hábito completo (...). É, pois, essa a decisão de Manuel - o castigo terrível do meu erro -, a concretização do caso dos condes de Vimioso, incompreensíveis mistérios de Deus.
Relativamente à doença de Maria, que faz parte igualmente do desenlace trágico, há numerosos indícios que nos preparam para a sua morte. No entanto, essa realidade é negada sucessivamente pelas personagens: a mim não se me pega nada (...), - E não há-de morrer: não, não, três vezes não (Telmo); Que febre, que ela tem hoje, meu Deus! Queimam-lhe as mãos ... e aquelas rosetas nas faces (...) (Telmo); Tens, filha (...) se Deus quiser, hás-de ter, e hás-de viver muitos anos para consolação de teus pais que tanto te querem (Madalena). Nesta frase, a realidade psicológica é dada pela sucessão dos tempos verbais a partir do presente do indicativo «tens», utilizado para sossegar o espírito de Maria. Segue-se uma oração do futuro do conjuntivo (se Deus quiser) que dá um caráter dubitativo aos futuros perifrásticos (hás-de ter, hás-de viver).
Quando Maria demonstra uma audição excecional, Jorge prevê algo de trágico em relação à sua sobrinha: Terrível sinal naqueles anos e com aquela compleição. Efetivamente, essa agudez é já um sinal da tuberculose de Maria. Manuel de Sousa tem igualmente a consciência da doença da filha: E esta testa ...escalda!; aquele sangue está em chama, arde sobre si e consome-se, a não o deixarem correr à vontade; a lançar sangue?....
Depois da anagnórise de Jorge em relação ao Romeiro, também Manuel fica a saber a verdade: o Romeiro é o próprio D. João de Portugal. Nesse momento, deseja a morte da filha, arrependendo-se de imediato: Eu queria pedir-te que a levasses já... e não tenho ânimo; peço-te vida, meu Deus. Deixa, então, o destino de Maria nas mãos de Deus: (...) e viva ou morta, cá deixo a minha filha (...). O mesmo arrependimento é seguido por Madalena: Oh, a minha filha... também essa vos dou, meu Deus.
E é Maria que se encarrega de concretizar esses indícios: (...) aqui não morre ninguém sem mim; (...) morro, morro ... de vergonha. (Cai e fica morta no chão).
Pode-se, assim, concluir que a obra constrói ela própria o seu final, edificando um desenlace trágico, tão ao gosto da tragédia grega. O fatalismo alimenta-se em cada cena, em cada ato e, progressivamente, empurra as personagens para a desgraça: foram (como diz Almeida Garrett, na Memória ao Conservatório Real) duas mortalhas que caíram sobre dois cadáveres vivos - jazem em paz no mosteiro, o sino dobra por eles; morreram para o mundo, mas vão esperar ao pé da Cruz que deus os chame quando for a sua hora.
* Professora de Português e formadora para a área da língua portuguesa
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