O número de penhoras marcadas pelo Fisco duplicou entre 2012 e 2014, passando de 927 mil para mais de dois milhões.
A implementação das penhoras automáticas, em vigor desde 2005, é apenas um dos sinais da desumanização de uma máquina fiscal mais oleada e, simultaneamente, desumanizada e implacável.
O aumento de impostos é sempre o remédio mais rápido que os governantes encontram para combater os desequilíbrios das contas públicas. Outra solução passa pelo combate à fraude e evasão fiscais. Os meios justificam os fins? A Paulo Macedo, diretor-geral dos impostos de 2004 a 2007, cargo que ocupou a convite de Manuela Ferreira Leite, então ministra das Finanças, atribui-se frequentemente grande parte da melhoria da eficiência fiscal, sobretudo no que depende da modernização e informatização da máquina fiscal. "Com Paulo Macedo houve uma intensificação desse processo, que já vinha de trás", reconhece Tiago Caiado Guerreiro, advogado especialista em questões fiscais.
Mas considera que foi também o início de uma perda de direitos dos contribuintes em matéria de defesa em situações irregulares. "Muitas vezes as pessoas pagam o que lhes é exigido nas notificações, ainda que indevidamente, porque é complexo, demorado e caro defenderem-se", explica. Defende também que "muitas multas são desproporcionais", como no caso da falta de pagamento das portagens, em que é exigido "100 vezes o seu valor, quando uma vez só já seria abusivo", De acordo com este fiscalista, melhorou-se a informatização do sistema fiscal e dos sistemas de controlo, mas "foi-se longe de mais", gerando abusos contra os contribuintes.
Na sua opinião, "é preciso tirar o pé do acelerador e virar agora esse sistema para as instituições do Estado", identificando e corrigindo o que está mal, o que permitiria cortar na despesa pública, "porque do lado da receita, em matéria de impostos , já estamos na fase de destruição de riqueza", avisa. João Magalhães Ramalho, coordenador da área de Direito Fiscal da PLMJ, considera que Portugal tem hoje uma das máquinas fiscais mais sofisticados a nível mundial, em matéria de informatização, cruzamento de dados e controlo das obrigações declarativas e contributivas dos cidadãos.
E salienta ainda "a melhoria da qualidade da máquina fiscal em termos dos seus profissionais". Mas diz que em algumas situações "passámos do oito para o oitenta", criticando a excessiva transferência para os contribuintes do trabalho do Fisco e alertando para os custos que isso representa para as empresas, que hoje "têm toneladas de formulários para preencher". Reconhece que, "por força da informatização, o sistema se desumanizou" e que "há exageros". Exemplos não faltam. Recentemente, o Fisco decidiu desativar o mecanismo informático de venda de casas penhoradas por dívidas fiscais
