Corpo do artigo
Também em política há boas ideias que na prática se revelam um fracasso e boas práticas que resultam de ideias, em teoria, desastrosas. Com a ideia que António José Seguro teve de propor a realização de eleições primárias para o candidato do partido a primeiro-ministro está a acontecer o primeiro caso. Com a campanha das primárias no terreno, está a verificar-se o segundo.
Vamos por partes. No primeiro caso é preciso contextualizar. O PS tinha acabado de averbar uma vitória pífia nas eleições europeias, que decorreram com a "troika" ainda ao rubro no nosso país, e o "challenger" de Seguro dera um passo em frente logo no rescaldo desse resultado vitorioso, mas pouco.
Com o partido a mostrar-se confuso e dividido, com a maioria dos dirigentes e notáveis hesitantes entre a comemoração da vitória ou o festejo do avanço de António Costa, o secretário-geral precisava de um golpe de asa que lhe permitisse mudar o campo e o timing da discussão. Para Seguro era decisivo não deixar que a discussão se fizesse "a quente", e esse tempo também era necessário para recompor "as suas tropas" e realinhar o seu discurso. Bem ao contrário, Costa ganharia com um processo imediato, com decisões em cima e no calor da refrega eleitoral pouco auspiciosa e que também não o obrigasse a abordar temas ou estratégias em que a diferença se notasse menos, ou quase nada.
Neste contexto, a ideia das primárias, que Seguro lançou com a ironia fina de até "in illo tempore", ter sido acarinhada por Costa, foi boa e pareceu excelente. Aprovadas formalmente, deu-se entrada na parte prática da coisa e admito que já hoje exista muita gente arrependida de ter apoiado militantemente esta ideia das primárias!
Como no PSD já se provou antes e no CDS também já deu para perceber no rescaldo do caso Portucale, não é boa política partidária andar a remexer em público nas questões dos militantes, suas quotas e cadernos eleitorais. O PS esqueceu-se dessa evidência e esta campanha das primárias, de Braga ao resto do país, serviu para nos mostrar que no partido de Seguro, estas questões também revelam pouca segurança. Passando dos militantes aos simpatizantes, o panorama não se revela mais animador e onde alguém imaginou uma grande campanha de adesão de eleitores genuinamente interessados em participar nestas eleições internas, o que estamos a assistir é a uma luta de fações que contam afanosamente as espingardas e o que se prevê para o fim da luta é que o vencedor fique a mandar num exército onde a metade derrotada dos efetivos vai desertar num ápice!
Noutro tempo, noutro local e em outro contexto as eleições primárias podem ser (e têm sido) um boa prática de uma boa ideia, apurando-se um candidato que se perfila para as eleições definitivas como uma escolha que já é de muitos e não de um petit comité partidário. No caso vertente do PS, ou eu me engano muito, ou o que a campanha das primárias está a prenunciar é que o PS venha a ter um candidato a primeiro-ministro, fragilizado, com os podres desvendados, os apoiantes divididos à partida e numa relação de forças com os partidos do Governo bem mais fraca da que tinha o líder da Oposição no rescaldo das Europeias. Relação essa, e aí estamos todos de acordo, que já não era famosa.
