Há uns anos criou-se o mito urbano de que "o Sporting não chega ao Natal!". Devia-se o mesmo ao facto de o Sporting começar muito bem os campeonatos e depois perder o fôlego, o que fazia com que, chegando o Natal, já estivesse arredado da luta pelo título.
Corpo do artigo
Tenho-me lembrado deste mito urbano quando vejo o que António Costa tem feito. Apontado como o salvador do PS e do país, e como político com melhor nível e preparação do que todos os outros, Costa tem, em poucas semanas, desbaratado essa imagem. Dando razão àqueles que, cinicamente, acham que o melhor é estar calado, porque quanto mais falar mais se descobre que "o rei vai nu". De facto, chegamos ao Natal e Costa já disse que não governava com a Direita e, logo a seguir, desfez-se em elogios ao Bloco Central que, segundo ele, foi fundamental para o país numa altura de crise (como a que vivemos).
Estes episódios demonstram bem o problema do PS: deseja coligar-se com a Direita, mas sabe que isso, hoje, não é popular e, pior do que isso, mostra que este partido não é alternativa mas apenas alternância. O que pode contribuir para reforçar os partidos à sua Esquerda, algo que receia. Por isso tenta o habitual discurso da união à Esquerda para, depois, dizer, "ofendido", que a Esquerda é que não o quis, pelo que se "vê obrigado" a coligar-se com a Direita...). O problema do PS é que, tal como acontece com os mentirosos, às vezes foge-lhes a boca para a verdade.
A entrevista que Manuel Pizarro deu esta semana ao JN é, também, sintomática.
Pizarro começa por puxar dos galões ao afirmar-se o "representante do Porto e do Norte no Secretariado"; e, categórico, sustenta que com um Governo do PS "chega a altura de o Norte ter o seu espaço certo na vida política nacional". Para além da bicada a José Luís Carneiro, líder da distrital do PS/Porto (que afinal não risca nada, pois no Norte, no PS, o novo vice-rei é Pizarro...), não posso deixar de sorrir com esta "costela do Norte" do seu discurso. É que todos sabemos como o Norte foi sucessivamente prejudicado pelos governos do PS, com inúmeros ministros e secretários de Estado provenientes da região a rapidamente deixarem-se ofuscar pelas luzes da capital, esquecendo as suas origens e a intenção de pôr o Norte no mapa. Naturalmente que, quanto à regionalização, Pizarro diz que a defende, mas que a mesma tem de ficar na "gaveta", apostando numa "descentralização participada" (grande chavão!), já que a revisão constitucional de 1997 acordada por Guterres e Marcelo "criou obstáculos terríveis" (nessa altura não ouvimos Pizarro a criticá-la).
Sobre a política de alianças, Pizarro empurra com a barriga: "A nossa ambição é ter maioria absoluta e logo isso dispensa um debate excessivamente aprofundado sobre coligações". Frisa-se a palavra "dispensa". Podia ter escolhido "livra-nos de" ou, ainda com mais franqueza, "permite-nos esconder o que verdadeiramente queremos em matéria de coligações".
Mas também Pizarro não resiste a continuar a falar. E, vai daí, consegue perscrutar que no PSD "ainda há sociais-democratas" e no CDS "democratas cristãos". Ou seja, para apaziguar eventuais rebates de consciência (que não a dele), afirma que há uma Direita com quem o PS se pode coligar. Qual é ela: o PSD e o CDS, que não deixam de ser a Direita nacional pelo facto de serem liderados pelo Rui ou pelo Zé. Clarinho como água!
Mas, com tanto fervor, Pizarro mostra, também, que a vereação na Câmara do Porto é, apenas, um lugar de transição (tal como em 2007, quando a abandonou para ir para o Governo). E que o seu amor pelo Porto apenas se manifesta enquanto não surge o verdadeiro amor: ser ministro do Governo. O que, a acontecer, vai ser um problema para o país. E vai criar um sério problema a Rui Moreira...