A Grécia regressa hoje ao palco negocial da Europa numa posição de fragilidade. Apesar de a mensagem continuar musculada - ainda ontem, o ministro do Estado entoava frases dramáticas como "algumas das reformas são inegociáveis, porque são matéria de soberania nacional" -, é mais do que notória a crescente capitulação do Governo de Alexis Tsipras face ao conteúdo arrojado do manifesto eleitoral com que foi eleito.
É a realpolitik. Talvez. Ou, como comentava por estes dias um diplomata do Norte da Europa, a "Grécia passou do sonho à realidade em apenas um mês". Já não há perdão da dívida, já não há meio ano de extensão do financiamento, já não há tantas certezas sobre uma série de coisas que os gregos nem sequer admitiam discutir. A "troika" mudou o nome para "instituições", o "memorando" passou a ser "acordo" e os "credores" agora são tratados por "parceiros". Atenas obteve um salvo-conduto de quatro meses que lhe permite manter a cabeça fora da água. Apenas isso. O pior ainda está para vir. Até junho, esbraceja em mar revolto.
Esticar a corda ao máximo para ter margem para recuar é um princípio básico de qualquer negociação. O Governo grego levou o esforço braçal ao limite das forças, talvez porque estivesse ciente de que a sua política alternativa, assente na diabolização da austeridade e na necessidade de dar uma resposta urgente aos desamparados sociais, dificilmente escaparia sem uma marca de bala por entre o silvo de tiros disparados em seu redor.
A excessiva dramatização que os gregos incutiram no processo negocial - o ministro das Finanças, Yanis Varoufakis, foi um ator talentoso - teve o condão de agitar as águas, despertar consciências, suscitar, enfim, uma discussão que tardava na Europa: a de que a estratégia seguida (que tão adequadamente o ex-líder do PSOE, Felipe González, chamou de "austericídio") foi apenas destrutiva. Na Grécia. Em Portugal.
Importa-me pouco discutir quem foram os maus da fita dos últimos dias. Todos sabemos quem foram os maus da fita dos últimos anos. Por muito que agora a consciência lhes pese nos desabafos públicos. Se os colegas de carteira da Grécia no Eurogrupo aceitarem as medidas de Atenas - assentes na reforma do Estado, no fim de algumas mordomias e num combate feroz à evasão fiscal ¬-, nada de significativamente novo vai acontecer. Mas o ar ficará mais respirável.
A Grécia radicalizou para colher (dentro e fora de portas); os países defensores da austeridade radicalizaram para não perder. Agora, é a vez dos atos. Chega de palavras.
EDITOR-EXECUTIVO-ADJUNTO
