Se era para ter impacto global, resultou. Julgo que nem quando o F. C. Porto ganhou a Liga dos Campeões e a Liga Europa, os feitos recentes de melhor memória para o desporto nacional, presenciámos tanta dedicação por parte dos órgãos de Comunicação Social internacionais.
Nada como um zeloso polícia a aviar umas bastonadas corretivas num pai e dois socos num avô, tendo como testemunhas os filhos e netos, para projetar a nação além-fronteiras. Europa, América, Ásia e por aí fora. O Portugal de Eusébio, de Mourinho e de Ronaldo é, também, o Portugal onde um agente graduado espanca sem complacência um adepto indefeso na presença dos filhos à saída de um estádio. Um bastão de aço contra - alega o subcomissário Filipe Silva em sua defesa - uma rajada de saliva.
Neste, como noutro acontecimento que ganha lastro nas redes sociais, é aconselhada prudência nos julgamentos públicos. Fazer justiça sem ser justiceiro. O que se conseguiu, porém, na gestão mediática deste ato tresloucado, foi levar a prudência demasiado a sério. Transformá-la numa cortina de silêncio.
A Direção Nacional da PSP, o Ministério da Administração Interna e os principais sindicatos da Polícia não ousaram, sequer, ter a decência de condenar uma investida policial que revolve as entranhas de qualquer ser pensante. Esconderam-se nos formalismos de gabinete, nos comunicados estéreis, nos inquéritos que seguem os seus termos. Não deram a cara. Ontem, a ministra da Administração Interna, Anabela Rodrigues, disse umas palavras de circunstância, salvaguardando a presunção da inocência do agente. Mas apenas porque os jornalistas insistiram muito.
Exercer o poder é também escolher lados, assumindo responsabilidades políticas e institucionais. É, voltando ao episódio de Guimarães, escolher o lado natural e óbvio: repudiar a brutalidade do agente Silva e pedir desculpa àquele pai, àquele avô e àqueles miúdos. Ninguém perdia a face por ter um gesto de humanidade, ninguém seria acusado de condenação prévia se apontasse o dedo ao agressor que devia proteger-nos. Era isto que gostávamos de ter ouvido: "A Polícia não compactua com impulsos desta natureza. O Estado português não patrocina esta forma de mostrar autoridade". Mas não. Ficámo-nos por um corporativismo cobarde de quem não quer manchar a imagem do rebanho por culpa de uma ovelha negra. Políticos a proteger polícias, polícias a proteger polícias.
O que eles não enxergam é que são as ovelhas negras que os arrastam para o lodo. O que é de uma profunda injustiça. Se não fosse a Polícia, certamente não haveria tantos estádios de futebol cheios. Pensem nisso.
EDITOR-EXECUTIVO-ADJUNTO
