O ator norte-americano John Turturro recebeu o prémio carreira
FRANCK ROBICHON/EPA
Estamos todos sentados no anfiteatro ao ar livre da Piscina do Sultão, no jardim em socalcos da Cinemateca de Jerusalém, somos cinco mil, e todos se levantam respeitosamente porque vai entrar Reuven Rivlin, o presidente do Estado de Israel (quando ele sair erguemo-nos todos outra vez).
O seu longo discurso é de exaltação, como os que se seguirão, do presidente da Câmara, da presidente da Fundação Jerusalém, da ministra da cultura (a ministra vai ser vaiada, mas por causa dos cortes ao Festival): à "fascinante e complexa saga da nossa nação" e à "variedade e liberdade do belo cinema de Israel, o cinema azul e branco, como é conhecido no mundo".
O público exulta e aplaude e ouvem-se muitas vezes as palavras "liberdade, democracia e vitalidade" do cinema hebraico que em 2014 vendeu 1,6 milhões de bilhetes entre 8 milhões de habitantes. Mas ninguém, entre toda a glorificação, falará de "Para além do medo", o filme sobre Yigal Amir, que assassinou em 1995 o primeiro ministro Isaac Rabin, que o Governo não deixou programar por não ser "suficientemente patriótico".
O sol já se pôs, já se arvorou o vento, e no meio da longa cerimónia surge uma estrela, quase eclipsada entre tanta auto-exaltação: o ator John Turturro, prémio carreira do 23.º Festival de Cinema de Jerusalém. Ele dirá, num agradecimento muito curto, "sempre quis cá vir, mas não era preciso darem-me um prémio logo na primeira vez que vim, é surreal".
Turturro faz declaradamente de ator mau no novo filme de Nanni Moretti, "Mia madre", uma ficção lenta e complacente sobre a morte da sua mãe e que não é demasiadamente bom para um nervo como o de Moretti, que há 14 anos fez o altíssono "O quarto do filho".
Antes do filme começar apareceu no ecrã descomunal uma mulher que morreu em Março e Jerusalém ainda chora: Lia Van Leef, mãe do festival. Uma frase define-a toda: "Ela acreditava que o cinema muda a realidade". Os 200 filmes de 50 países que aqui vão passar até dia 16 são-lhe todos dedicados.